segunda-feira, abril 30, 2007

Um filme, duas imagens


Entre as estreias de 2007, Assalto e Intromissão, de Anthony Minghella, é uma das grandes vítimas. Sublinho: vítimas. Porque é muito fácil — é mesmo um "desporto" a que muio boa gente gosta de se dedicar — explicar os movimentos do mercado pela "indiferença" dos jornalistas ou pela "maldade" dos críticos... De facto, semelhantes generalizações servem quase sempre para retirar responsabilidade(s) a quem comercializa os filmes.
Não que distribuidores e exibidores se devam reger por critérios jornalísiticos (muito menos críticos) — a legitimidade das suas opções não está em causa. O certo é que o reconhecimento formal dessa legitimidade não nos deve impedir de lembrar um facto muito objectivo: por vezes, há filmes que, apesar dos seus trunfos comerciais (sublinho: comerciais), são colocados no mercado sob o efeito de uma indiferença que, na prática, só pode apagar a sua imagem junto dos espectadores potenciais.
Assalto e Intromissão foi um desses filmes. E não o foi por razões portuguesas, entenda-se. Em boa verdade, o filme — mesmo tendo um elenco com nomes como Jude Law, Robin Wright Penn ou Juliette Binoche, e apesar de Minghella ser o autor de um título tão popular como O Paciente Inglês (1996) — começou por ser demonizado no mercado dos EUA. Razões para tal? Várias, certamente, a começar pela mais insólita, mas cruelmente verdadeira: os novos especialistas (?) do marketing quase só sabem trabalhar "homens-aranhas", "harry-potters" e produtos afins. Na prática, não têm ideias para lidar com um bom melodrama à moda antiga, para mais empenhado em falar das relações humanas num tom grave, seriíssimo e completamente adulto. Afinal, de contas, nada que fosse impossível prever.
Episódio mais recente deste calvário a que o filme de Minghella está sujeito: depois de ser lançado com um belíssimo cartaz [acima reproduzido], irá surgir no mercado do DVD (pelo menos nos EUA), com esta capa absolutamente vulgar.


Que se faz, assim? Tenta-se transformar um objecto de grande riqueza e complexidade emocional numa história em que as personagens "vão para a cama"... Não, não é que seja uma informação falsa. O problema é outro: ao sugerir Assalto e Intromissão como um derivado das ficções mais ou menos "cor-de-rosa", o marketing está a enganar, pela segunda vez, o espectador/consumidor.
Claro que é possível (e, mais uma vez, legítimo) tentar seduzir o espectador. Mas é preciso fazê-lo através de informações que falem verdade sobre o filme em causa. Essa é, afinal, a mais básica regra de marketing — e também a mais esquecida.
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PS - Até mesmo a mudança das palavras é significativa. Assim, a capa do DVD reproduz uma banalíssima frase (pelo menos fora do respectivo contexto) de um artigo da imprensa: "A sexy, thoughtful, smart film." Desapareceu, desde modo, a belíssima frase promocional do cartaz original: "Love is no ordinary crime."