quinta-feira, abril 26, 2012

Discos pe(r)didos:
Dave Ball, In Strict Tempo


Dave Ball
“In Strict Tempo”
Some Bizarre
(1983)

Não podemos contar a história da primeira geração pop electrónica britânica sem referir o nome dos Soft Cell e, sobretudo, o seu álbum de estreia Non Stop Erotic Cabaret, que além de juntar histórias de outros lados da noite que não as celebradas nas plataformas mais dadas ao escapismo na alvorada dos oitentas, cruzavam o interesse pela exploração dos (então) novos sintetizadores com heranças da northern soul e outras referencias que fizeram da sua uma presença ímpar no panorama da época. Avessos ao peso que a fama súbita (chegada em 1981 com o impacte global) de Tainted Love, os Soft Cell cedo deixaram claro que eram uma dupla mais dada a explorar ideias para lá dos limites do terreno seguro em que habitualmente de fazem os nomes mais populares que a repetir receitas. No segundo álbum, The Art Of Falling Apart (1983) deixam já marcas evidentes dessas demandas e, ainda antes de anunciarem a separação (editariam ainda um álbum depois, em 1984 e reunir-se-iam muitos anos depois para novos discos e concertos) encetam carreiras a solo. Marc Almond, o vocalista, começara mesmo em 1982 uma aventura mais centrada na sua personalidade e obsessões através dos Marc and The Mambas, iniciando só em 1984 um percurso a solo em nome próprio. Dave Ball, o teclista que com Almond completava a formação dos Soft Cell, tem em In Strict Tempo, álbum de 1983, o seu primeiro disco para lá das fronteiras do grupo que o revelara. É, tal e qual o que Almond mostrou com os Mambas, um disco que escapa ainda mais ao que foram as memórias da etapa 1981-82 dos Soft Cell. Mais que em The Art of Falling Apart, mas com um alinhamento mais consequente que o que com Almond registaria em 1984 em This Last Night In Sodom, In Strict Tempo afirma ideias para lá das fronteiras da pop (com Rednecks representando aqui o único episódio mais próximo desses outros terrenos), num alinhamento dividido entre ocasionais canções e temas instrumentais onde colaboram figuras como Gavin Friday, Genesis P Orridge e Virginia Astley, entre outros. Longe de ser uma obra-prima perdida (ao contrário do que poderemos dizer do notável e injustamente ignorado Torment and Toreros que Marc Almond gravou como Marc and The Mambas), In Strict Tempo é todavia um bom exemplo de experiências possíveis em tempo de conquista de novas ferramentas ao serviço da música popular.

E depois do disco
Dave Ball não deu grande continuidade à ideia de construir uma banda em nome próprio. Anos depois formou os The Grid, através dos quais voltou a refletir sobre a relação entre as heranças da pop e as electrónicas, aqui porém mais perto dos espaços da música de dança. Em inícios dos 90 remisturou um tema de Marc Almond, com ele reativando mais tarde, e por algum tempo, os Soft Cell.

Sueco vence prémio de fotografia da Google

O fotografo sueco Viktor Johansson é o vencedor do concurso de fotografia promovido pela Google. A série de imagens que fez sobre o campeão sueco Christoffer Eskilsson (saltos de prancha a 10 metros) valeram-lhe o triunfo.

Podem ver as suas imagens e a dos restantes concorrentes com melhores classificações aqui.

E os Stones chegam à América

Com dois singles editados em territórios europeus em 1963, só no ano seguinte os Rolling Stones chegaram aos Estados Unidos. O seu primeiro single americano foi Not Fade Away, uma versão de um tema de Buddy Holly. No Reino Unido o single subiu ao terceiro lugar da tabela de vendas e foi o primeiro Top 5 do grupo.

quarta-feira, abril 25, 2012

O júri de Cannes 2012

Já era conhecido o nome do presidente do júri do 65º Festival de Cannes: Nanni Moretti (foto). Agora o certame divulgou os nomes dos restantes oito membros do colectivo que vai decidir o palmarés de 2012. São eles (imagens em baixo, da esquerda para a direita):

- EMANUELLE DEVOS, actriz francesa
- JEAN-PAUL GAUTIER, estilista francês
- ANDREA ARNOLD, cineasta britânica
- EWAN McGREGOR, actor britânico
- HIAM ABBASS, actriz e cineasta palestiniana
- RAOUL PECK, cineasta haitiano
- DIANE KRUGER, actriz alemã
- ALEXANDER PAYNE, cineasta americano

"Milestones" (RTP2, 23h30)

É, por certo, um dos momentos altos deste ano cinematográfico: Milestones (1975), de Robert Kramer, obra-prima do cinema independente americano, passa hoje, dia 25 de Abril, na RTP2 — este texto foi publicado no Diário de Notícias (22 Abril), com o título 'Para redescobrir um clássico americano'.

Não será arriscado prever que, ao longo da próxima semana, o lançamento do filme Os Vingadores (primeiro blockbuster da temporada de Verão) terá honras de destaque em vários serviços informativos da televisão. Surpresa? Nenhuma. Os modelos dominantes da informação televisiva alheiam-se sistematicamente da mais inteligente produção americana, incluindo a que sai dos grandes estúdios, preferindo destacar produtos como Os Vingadores cuja avassaladora mediocridade apenas envergonha as mais nobres tradições de Hollywood.
Desta vez, nos bastidores desta rotina preguiçosa, deparamos com uma ironia complementar: o grande filme da semana tem chancela de distribuição de uma pequena empresa (Periferia Filmes) e estará, não nas salas de cinema, mas... na televisão (RTP2, dia 25, 23h30). É também americano, surgiu no ano de 1975 e provém do período mais radical e mais heróico do cinema independente dos EUA: chama-se Milestones e ilustra o génio criativo de Robert Kramer (1939-1999), autor incontornável desse cinema, aliás com uma forte relação afectiva e profissional com o nosso país, onde realizou Scenes from the Class Struggle in Portugal (1977).
Em termos simples, podemos resumir Milestones como uma consequência directa, ao mesmo tempo política e existencial, dos títulos anteriores de Kramer, em particular Ice (1970), e da sua colaboração com John Douglas (que co-assina a realização de Milestones). Na sua origem temática estão os movimentos sociais e culturais da década de 60, com raízes na esquerda mais radical e tendo como pólo fundamental a contestação da guerra do Vietname. Em todo o caso, o filme, uma colagem poética de muitas histórias de personagens à deriva, há muito transcendeu qualquer discurso ou apropriação de carácter panfletário, impondo-se pela sua dimensão genuinamente épica. O que, entenda-se, não exclui um angustiado intimismo apostado em questionar as certezas mais tradicionais das relações familiares e sociais.
Premiado no Festival da Figueira da Foz de 1975, Milestones transformou-se num “ovni” lendário que, para duas ou três gerações de espectadores, permaneceu como um clássico praticamente invisível (em finais de 2010, surgiu numa edição francesa em DVD, juntamente com Ice). Além do mais, desde a interrogação das raízes da nossa identidade social até às contaminações entre documentário e ficção, há nele uma actualidade que tem tanto de metódico quanto perturbante. A herança de Kramer constitui mesmo um dos tesouros esquecidos do cinema made in USA da segunda metade do século XX, sendo também dele o admirável Route One USA (1989), uma outra viagem sobre um país à procura do seu centro geográfico e simbólico. Sejamos, por isso, rigorosos: a passagem de Milestones na RTP2 constitui, desde já, um dos acontecimentos centrais de todo o ano cinematográfico de 2012.

>>> Sobre Milestones + Ice em DVD (Los Angeles Times).
>>> Entrevista com Robert Kramer e John Douglas (Jump Cut).
>>> Contra-cultura dos anos 60 (Wikipedia).

Um pequeno filme

Chamam-se Weird Shapes e têm um novo single, que apresenta o tema Clouds no Lado A. Para o acompanhar propõem um teledisco que se apresenta na forma "alargada" como um pequeno filme. O teledisco é assinado sob a designação The Night Thief. Aqui ficam as imagens.

Novas edições:
Field Music, Actually, Nearly


Field Music
“Actually Nearly”
Memphis Industries
4 / 5

Mais que apenas um dia para viver e celebrar os espaços das lojas independentes de discos, o Record Store Day começa a ser um pólo de agitação junto do qual cada vez mais artistas lançam títulos para o apetite dos seus mais atentos seguidores e colecionadores. E entre as várias edições especiais (quase todas com um número limitado de cópias disponíveis) apresentadas este ano conta-se um single assinado pelos Field Music. É um sete polegadas, juntando duas versões para dois temas que intregraram o alinhamento de Actually, o álbum de 1987 dos Pet Shop Boys. Trocando o protagonismo das electrónicas e a angulosidade da estrutura rítmica (particularmente evidente em Heart) das versões originais, os Field Music apresentam uma visão onde as guitarras são o braço direito da voz, mas toda a alma pop da canção permanece bem clara. Ambos os temas foram, entre 1987 e 88, singles lançados pelos Pet Shop Boys. Rent é um dos seus melhores temas de sempre e talha uma love song sob um ângulo bem distinto dos lugares comuns habituais. Heart, por sua vez, era um dos mais evidentes entre os primeiros sinais de atenção de uma banda pop pelos instantes de revolução que começavam a brotar da nova música de dança (assimilando em particular dinâmicas escutadas na house). Actually, nearly celebra assim a memória de um álbum maior na história da pop dos oitentas e assinala mais um reconhecimento pela importante contribuição da dupla Tennant/Lowe para a história da música popular. Detalhe importante, a citação evidente da pose dos músicos na capa de Actually é outro dos trunfos de um single que, para já, não tem quaisquer representações nem em CD nem em formato para download. Uma peça de coleção, portanto.

Nome de rua


Chega em finais de maio. Mas a capa já é conhecida. Esta é a imagem que poderemos ver na capa do próximo álbum dos St. Etienne. Trata-se de uma planta de uma cidade imaginária cujas ruas são nome de canção. Lá podem encontrar a Penny Lane (dos Beatles), a Arnold Lane (dos Pink Floyd) ou a Yellow Brick Road (de Elton John). O projeto tem assinatura Dorothy, um coletivo de Manchester. O álbum, com o simples título Words and Music By Saint Etienne sai a 28 de maio.

Salvio e D. Sebastião

Um dos efeitos mais curiosos, e também mais perversos, da mitologia futebolística é o seu continuado esvaziamento de outras mitologias. Observe-se, por exemplo, a capa de A Bola, do dia 24 de Abril de 2012. Será preciso uma enorme boa vontade para supor que Salvio virá a obter um lugar heróico
na história do nosso abençoado país — em todo o caso, isso não surge como impedimento para o envolver nas boas graças de um sebastianismo revisionista (ou revivalista, se preferirem) que se exprime com uma candura, no mínimo, desconcertante. Candura, de facto: não há aqui a intenção maligna de desagregar a história, reduzindo-a a uma colecção de referências irrisórias (mesmo se é esse o efeito prático mais comum destas "ironias" jornalísticas); há, isso sim, uma apoteótica indiferença por tudo o que possa ter a ver com a nossa identidade colectiva e respectivas relações com o património de séculos e séculos. Na sua Mensagem (1934), Fernando Pessoa vislumbrou no jovem monarca, desejado, o símbolo magoado de uma ânsia de reconquista de uma errática identidade colectiva — salvo o devido respeito pelos talentos do jogador, não parece legítimo supor que o poeta encarasse o nome "Salvio" como um possível heterónimo de D. Sebastião.

P.S. - Obrigado aos leitores que chamaram a atenção para o erro: "Salvio" e não "Saviola". Também eu fui contaminado pela instrumentalização dos nomes. Billy Wilder avisa: Nobody's perfect.

terça-feira, abril 24, 2012

Miguel Portas (1958 - 2012)

FOTO DN
Saber da morte de alguém que pertence à nossa geração e com quem trabalhámos, durante anos (neste caso, estive no jornal Expresso juntamente com o Miguel), envolve sempre um malfadado narcisismo — contemplamos algo que morre também dentro de nós, deixando a memória fria das cinzas do tempo. Num momento destes em que nenhuma palavra é redentora, quero lembrar a capacidade do Miguel lidar com o contraponto, por vezes contraditório, das ideias dos outros: era um homem de convicções que sabia o valor das convicções dos outros. E isso faz-nos sempre falta. Incluindo o humor.

>>> Obituário no Público.