Pedro Borges à porta do Ideal, na rua do Loreto [FOTO: Orlando Almeida / DN] |
Três curtas-metragens portuguesas foram lançadas pela Midas Filmes. Pedro Borges, director da distribuidora, também responsável pelo cinema Ideal, em Lisboa, comenta o evento — esta entrevista foi publicada no Diário de Notícias (13 Setembro), com o título '“As curtas-metragens são para inventar, inovar, surpreender"'.
A comemorar três anos de existência, o cinema Ideal apresenta "3 Novas Curtas Portuguesas".É mais uma proposta da Midas Filmes, distribuidora, exibidora e produtora — Pedro Borges, fundador e director da empresa, faz o ponto da situação.
As curtas-metragens tornaram-se raras no actual sistema de distribuição/exibição. Que razões levaram a Midas Filmes a arriscar na apresentação deste programa com Cidade Pequena [Diogo Costa Amarante], Coelho Mau [Carlos Conceição] e Farpões Baldios [Marta Mateus]?
A estreia de uma curta-metragem foi sempre uma excepção e quase sempre "colada" a uma longa. Muito raramente correu bem. Esta ideia de juntar três filmes e dar-lhes um estatuto de "filmes à séria" surgiu da sua própria circunstância: três filmes muito bons, um Urso de Ouro de Berlim, ao mesmo tempo que duas curtas em Cannes e depois uma delas a receber o Grande Prémio de Vila do Conde. E a vontade de uma afirmação política clara numa altura em que o cinema português que interessa e o seu Instituto viveram uma dramática tentativa de assalto e privatização. Quer dizer, mostrar que há um cinema português que vem do Cinema Novo dos anos 60 (e que à excepção de Oliveira, sabia que tudo o resto que houve antes era abominável) e que foi passando o testemunho: estes jovens cineastas (e outros como eles) são dignos herdeiros dessa linhagem, têm um talento mais que evidente e uma vontade de fazer cinema muito estimulante. As curtas-metragens não são para macaquear a televisão nem para contar historietas, são para inventar, inovar, surpreender. Estas "3 Novas Curtas Portuguesas" são isso mesmo e a sua estreia é apenas a "continuação da (mesma) guerra por outros meios"…
Há um contraste evidente entre o número de curtas que se vão fazendo em Portugal e as que, efectivamente, são exibidas nas salas — para além deste exemplo concreto, que medidas se poderiam tomar para dar mais visibilidade aos filmes?
Não creio que seja uma circunstância exclusivamente portuguesa. E hoje em dia há todo um circuito em que os filmes circulam e são mostrados que tem um valor próprio: todos os dias do ano estão a acontecer por esse mundo fora umas centenas de festivais de cinema de todo o género e feitio que convocam milhões de espectadores. É outra coisa que não cinema, mas é também uma maneira de os filmes serem vistos.
Esta estreia no cinema Ideal acontece pouco depois da reposição de dois musicais clássicos de Jacques Demy, outro modelo de espectáculo pouco frequente nas salas — as apostas deste género vão continuar?
Hoje em dia tudo está disponível em todo o lado ao mesmo tempo. Se não contrariarmos esta ideia feita e não nos reinventarmos todos os dias, estaremos condenados. Estamos sempre a pensar em cem anos de filmes e a ver o que se está a fazer de novo.
A Midas mantém, em paralelo, um importante sector de edições em DVD. Do ponto de vista comercial, como funciona essa relação? O DVD pode ser decisivo ou é sempre a exibição em sala que define a performance de um filme?
Embora os cinemas estejam a morrer, a verdade é que só os filmes que existem nos cinemas é que verdadeiramente existem. Não economicamente — os resultados da sala de cinema são quase negligenciáveis —, mas como trabalho para durar no tempo. Porque os filmes que duram dois meses, já nascem mortos… Os filmes que interessam acabam sempre por ter uma vida saudável no cinema e depois no DVD e em todas as plataformas em que hoje em dia se vê cinema. Mas as salas de cinema são e serão sempre decisivas para que os bons filmes se dêem a conhecer e vivam.
Três anos depois da abertura do Ideal, que balanço se pode fazer da sua actividade? Estamos perante um relançamento do modelo tradicional das salas de "arte e ensaio"?
Creio que um pouco de estatística é importante: estreámos quase 200 filmes e só um terço deles era distribuição da Midas. Um quarto do total foram portugueses: 48 filmes. E documentários foram 44 e reposições 14. O nosso grande falhanço foi que, ao fim de três anos, apenas mais um cinema parecido com o Ideal reabriu (no Porto, o Trindade). Devia haver por esse país fora mais uma ou duas dúzias de cinemas assim. Não seremos nós a fazê-los, mas alguém deveria fazê-lo. Assim houvesse uma política pública para o cinema...