'Uma televisão para a música?'
(30 de Outubro de 2005)
Estão a chegar os Prémios MTV (3 Nov., Pavilhão Atlântico) e a algazarra mediática começa a impor as suas regras: promove-se agitação e ruído, e tanto mais quanto não se tem nada para dizer. Provavelmente, o espectáculo vai ser excelente — esperemos que sim (tanto mais que, independentemente de gostos ou desgostos, o cartaz prometido é de luxo). Em todo o caso, esta é uma boa altura para colocar — e, no nosso caso, renovar — uma interrogação metódica: onde está a MTV prometida nos tempos heróicos dos anos 80 e do boom dos telediscos?
Claro que muita coisa mudou, a começar por aquilo que faz a aliança fundadora do canal: música + televisão. Mudaram as canções e os ritmos, os estilos e as experimentações (será que mudaram assim tanto?...). Mudou a televisão enquanto técnica, estética e mercado (e mudou mesmo muito). Mas, perante tudo isso, e também através disso tudo, como é que mudou a MTV? A resposta é, infelizmente, muito pouco optimista: mudou para o pior da televisão, passando a combinar uma lógica repetitiva e redundante (dominada pelas variantes mais reaccionárias daquilo a que ainda se vai dando o nome de hip hop) com os registos mais medíocres da reality TV (representando muitas vezes os adolescentes como desmioladas máquinas sexuais). Até mesmo aquilo que era um princípio básico do canal — a descoberta de nova(s) música(s) através da revelação dos respectivos telediscos — passou a ser uma envergonhada faceta de pouquíssimos tempos de programação.
Na prática, a MTV vende-se em nome da «juventude» e da «rebeldia», mas transformou-se numa paisagem de estranha preguiça criativa e banal conformismo ideológico — a não ser que consideremos que fazer televisão moderna é agitar muito as câmaras e falar em tom acelerado de «'tá bem»...
Claro que continua a haver muitos telediscos que vale a pena descobrir. Mas a ideia de uma televisão, não apenas com música, mas para a música, essa anda perdida no labirinto de um «marketing» maciço, repetitivo e sem imaginação. E a música não merece este estado de coisas.