domingo, agosto 12, 2012

Retratos de Debussy

A poucos dias de se assinalarem os 150 anos do nascimento do compositor, uma caixa de 18 CD, lançada pela Deutsche Grammophon, propõe um panorama da sua obra através de uma série de gravações do arquivo da editora.

O modelo tem sido aplicado pela Deutsche Grammophon nas mais recentes grandes efemérides. Numa caixa, com mais ou menos discos (em função do volume da obra e da força da sua herança), recolhem-se as peças mais representativas do compositor que se evoca, para cada uma escolhendo uma gravação do catálogo da editora. Arrumam-se as obras, peças orquestrais para um lado, instrumentais para outro, câmara para ali, vocal para acoli, ópera ou música coral (quando as há) mais adiante... Com Messiaen, em 2008, a verdade é que a Deutsche Grammophon assim criou uma das mais valiosas coleções de referência sobre um dos compositores mais marcantes e interessantes do século XX. Depois, com Mahler apresentou-se um mapa panorâmico, segundo abordagens diferentes (a EMI Classics lançou igualmente uma caixa bem recomendável por essa altura). Agora, com Debussy, o formato repete-se, entre a seleção surgindo escolhas que, inevitavelmente, deixam importantes gravações de fora. Há quem goste mais de umas, quem prefira outras. Escolhas são sempre escolhas. O certo sendo que, entre opções melhores e outras eventualmente nem por isso, o modelo destas caixas serve, mais que uma visão antológica, o eventual impulso de descoberta em tempos de mediatização maior de uma obra (as efemérides têm esse hábito)... E, convenhamos que, no registo da coisa panorâmica, sempre ficamos assim mais bem servidos que com aqueles álbuns com cara de ‘best of’, a tentar apertar em um ou 2 CD pequenas coleções de excertos ao velho estilo das “melodias de sempre”...

Não vamos aqui discutir a seleção das gravações. Porque é preciso ter um conhecimento mais profundo e global do acervo de registos que, pela história da Deutsche Grammophon, Phillips e outras etiquetas eventualmente disponíveis a quem decidiu as escolhas, permite criar um olhar desta amplitude sobre a obra de Claude Debussy. O certo é que contamos aqui com alguns episódios claramente dignos de morar numa escolha deste calibre. Obras orquestrais por Pierre Boulez, com a Orquestra de Cleveland. Os Études para piano por Mitsuko Uchida. Os dois “livros” de Prelúdios por Krystian Zimerman. Uma sonata pela dupla Argerich/Maisky. Outra, com assinatura Dumay/Maria João Pires. A ópera Pelléas et Mélisande numa direção de Claudio Abbado, com as vozes de Ewing, Le Roux, Ludwig ou van Dam, o Konzertvereinigung Wiener Staatsopernchor e a Filarmónica de Viena... Entre a multidão de lançamentos que assinalam a efeméride (a 22 de agosto), esta Debussy Edition é uma proposta de revisão ampla e cuidada. A melhor? A melhor é sempre a que nasce da escolha individual das gravações, ao gosto de quem as ouve e seguindo a relevância histórica e interpretativa de cada um. Uma antologia nunca é, apesar do cliché, um “melhor de”. É antes um “retrato de”. E como retrato, cumpre o papel de nos dar uma visão informada sobre uma obra central no processo de invenção da modernidade.


Três dos discos que a nova caixa revisita. No primeiro, algumas obras orquestrais em gravações da Orquestra de Cleveland, sob direção de Boulez (edição original de 1995). No segundo, os Études, por Mitsuko Uchida (1989). No terceiro, a ópera Pélleas et Melissande, por Abbado (1992).