segunda-feira, dezembro 05, 2011

Max Raabe: tudo é teatro!

Concerto apoteótico na noite de domingo no Grande Auditório da Fundação Gulbenkian: Max Raabe trouxe as memórias da música da República de Weimar, o sabor irónico dos ambientes de cabaret, os standards da época de ouro dos musicais americanos, enfim, algumas delirantes derivações pop (incluindo Oops!... I Did it Again, de Britney Spears). Tudo servido com um misto de frieza e charme que faz dele — e da sua impecável Palast Orchester — um fenómeno capaz de conferir nova dimensão à nostalgia de um tempo que, cedendo à nossa ingenuidade, nos atrevemos a imaginar mais puro e inocente que o nosso atribulado presente.
Em todo o caso, seria demasiado fácil reduzir Max Raabe a uma mera derivação revivalista, preguiçosamente apoiada na vampirização fácil dos clássicos (não, não é o Michael Bublé dos anos 1920/30...). Se ele consegue preservar um tão contagiante sentimento de festa e, mais do que isso, de cerimónia musical, isso decorre de uma teatralidade pacientemente elaborada. Em boa verdade, no seu universo tudo é teatro: Max Raabe não se finge um "natural" dos tempos e referências que convoca; a sua arte consiste em criar um aparato visual e cénico (tudo é marcação, incluindo os milimétricos passos para chegar ao microfone, entrar na zona de luz e começar a cantar) capaz de gerar um sistema de fruição que nasce da distância temporal e da distanciação narrativa.
Ou seja: assistimos a uma encenação da nossa própria imaginação e da saborosa impossibilidade de revisitarmos o paraíso perdido da memória. Se ainda há "brechtianos" no entertainment contemporâneo, Max Raabe é um deles, porventura dos últimos e também dos mais radicais.

>>> Um registo do canal Arte, com Max Raabe e a Palast Orchester a interpretar Singin'in the Rain (tema que não integrou o alinhamento do concerto da Gulbenkian).


>>> Site oficial de Max Raabe.