Nos seus radiosos 26 anos, Katy Perry achou por bem tecer algumas breves considerações sobre a presença em palco de Madonna. Palavras ligeiras e ligeiramente fundamentadas, mas que de imediato adquiriram uma espectacular ressonância mediática — afinal de contas, tudo o que soa a "juventude", em especial o mais anedótico ou inconsequente, tem o caminho facilitado no mundo em que vivemos.
Assim, segundo a MTV, Perry terá declarado o seguinte ao tablóide The Sun: "Para mim, a espiritualidade é qualquer coisa de muito importante e não gosto quando as pessoas a encaram com ligeireza." Em boa verdade, alguém como Madonna poderia ter subscrito tão cristalinas palavras. Em todo o caso, concluiu: "Por vezes, não compreendo por que razão alguns artistas jogam esse trunfo, como quando Madonna se põe numa cruz para cantar."
Referia-se Perry a um quadro da "Confessions Tour" (2007), para a canção Live to Tell. E é sempre doloroso observar como alguém, para mais tão jovem, desconhece a sua própria árvore genealógica — afinal de contas, quando Perry lançou o seu single Ur So Gay (2008), uma das primeiras pessoas a chamar a atenção para as singularidades do seu estilo foi... Madonna. Além do mais, há qualquer coisa de irremediavelmente patético no recalcamento do facto de a cruz ser um elemento nuclear da iconografia artística de Madonna, literalmente desde um tempo em que Perry ainda não tinha nascido.
Registe-se, ainda assim, o comovente detalhe da prédica de Perry: "não compreendo por que razão...". Vivendo nós sob a ditadura mediática da "juventude" — em que os mais grosseiros disparates são todos os dias caucionados pelo suposto saber de quem é "jovem" —, é bom saber que alguém começa a não compreender...
Todos temos direito a não compreender e não faz sentido obrigar os mais jovens, só porque são jovens, a comportar-se como especialistas de todos os temas e todas as transcendências. Escusado será lembrar que exactamente o mesmo se aplica aos menos jovens.
Todos temos direito a não compreender e não faz sentido obrigar os mais jovens, só porque são jovens, a comportar-se como especialistas de todos os temas e todas as transcendências. Escusado será lembrar que exactamente o mesmo se aplica aos menos jovens.