A cruz de Madonna é, de uma só vez, um símbolo com memórias e um adereço da sua própria mise en scène. Que é como quem diz: não a podemos compreender fora do conceito de espectáculo que a convoca, enquadra e recria. Um pouco como as suas próprias imagens fotográficas, ela trabalha a cruz como um desafio simultaneamente iconográfico e expressivo. Daí a opção intimista: cantar sobre ela o emblemático (e muito religioso) Live to Tell. Daí também o registo militante: a cruz abre uma longa secção de The Confessions Tour em que se convocam iconografias tensas — hebraicas e muçulmanas —, para as reduzir à sóbria condição de sinais abstractos que podem coexistir no interior das linguagens. Chama-se a isto fazer política.