segunda-feira, novembro 01, 2010

Grigory Sokolov, encore


É bem verdade que o génio de um pianista não se mede pelo número de encores que um seu concerto possa conter: no dia 31 de Outubro, no Grande Auditório da Fundação Gulbenkian, Grigory Sokolov ofereceu nada mais nada menos que sete!
Em todo o caso, valerá a pena dizer que tal "excesso" decorre de uma impressionante generosidade do músico, não apenas em relação à sua música, mas também perante os seus espectadores — que foram muitos, ocupando todos os lugares da sala, incluindo plataformas e cadeiras instaladas no palco.
Digamos, então, para simplificar, que Sokolov possui essa faculdade invulgar de nos fazer sentir que nenhuma obra está fechada, porque nenhuma interpretação existe como mera "transcrição" seja do que for (com ou sem telemóveis indisciplinados a poluir a atmosfera...). As repetições não repetidas de Bach (Partita nº 2, em Dó menor, BWV 826), a poética agreste de Brahms (Sete Fantasias, op. 116), ou ainda as tensões nunca esgotadas das melodias de Schumann (Grosse Humoreske, em Si bemol maior, op. 20; Scherzo, Gige, Romanze e Fughetta, op. 32), tudo soou a coisa em estado nascente, como se Sokolov discutisse com o seu piano as próprias possibilidades que cada compositor estipulou, intuiu ou sugeriu.
Tinhamos uma memória ainda próxima de Sokolov — na mesma sala, num concerto realizado há cerca de um ano. Percebemos, assim, que o seu génio se repete, mas sem nunca ser igual. E que esse paradoxo se aproxima do sublime. Teríamos aceite, com a mesma infinita disponibilidade, mais 7 encores. Ou mais 70.