segunda-feira, agosto 23, 2010

Truffaut — a última entrevista

Rodagem de Fahrenheit 451 (1966)

>>> (...) Aqui em França, devemos muito ao cinema americano, facto que os próprios americanos conhecem mal. Especialmente em relação ao cinema americano dos primeiros tempos, que os americanos mal conhecem e do qual muitas vezes troçam. Quanto a americanos influentes por altura da Nova Vaga, penso em Sidney Lumet, Robert Mulligan, Frank Tashlin e Arthur Penn. Representavam uma renovação total do cinema americano, um pouco como alguns dos realizadores da Nova Vaga em França. Os primeiros filmes desses homens tinham qualquer coisa de vital, como os pioneiros e primitivos do cinema americano, ao mesmo tempo que eram muito intelectuais — os seus filmes conseguiram unir o melhor das duas qualidades. Na altura, os americanos troçaram desses cineastas porque não os conheciam bem e também por não terem sucesso comercial. O sucesso é tudo na América, como você sabe melhor que eu. <<<

São palavras de François Truffaut que podem servir para sublinhar um valor cuja pertinência permanece intacta: a disponibilidade para ver/desfrutar/criticar o cinema para além de todos maniqueísmos, sejam eles estéticos ou económicos. São também palavras que, não sendo inéditas, são pouco conhecidas. Fazem parte daquela que foi a derradeira entrevista de Truffaut, realizada por Bert Cardullo, em fins de Maio de 1984, em Paris, nos escritórios de Les Films du Carrosse, cerca de cinco meses antes da morte do cineasta.
Incluída na antologia Action!: Interviews with Directors from Classical Hollywood to Contemporary Iran, organizada por Gary Morris, a entrevista surge agora divulgada nas páginas da revista The New Yorker, através de Richard Brody (autor do blog The Front Row) — é um documento precioso que nos ajuda a perceber a dívida cinéfila que mantemos em relação a Truffaut.