Em televisão, fala-se de futebol ou de um inevitável... destino? — este texto foi publicado no Diário de Notícias (26 de Fevereiro), com o título 'Filosfia da verdade'.
No passado sábado [20 de Fevereiro], o primeiro golo do jogo Everton-Manchester United, da Premier League (SportTV), foi dos visitantes, aos 16 minutos, marcado por Berbatov. Três minutos depois, Bilyaletdinov empatou, suscitando esta observação ao comentador: “(...) Não que o Everton tenha feito muito por isso.” Quase apetece inverter o maniqueísmo da frase, acrescentando que o Everton tinha o direito de utilizar os 71 minutos que faltavam para “fazer alguma coisa por isso...” (tanto mais que conseguiu uma brilhante vitória por 3-1).
Mas não é disso que se trata. Importa mesmo insistir na recusa desse ziguezague de frases feitas que tende a reduzir as maravilhas do futebol ao cumprimento de um “destino”. Poderia até ter acontecido que o Everton tivesse jogado ainda pior do que aquilo que vemos em alguns jogos da Liga portuguesa... Qual era o problema? O que se discute, aqui, é a transformação da televisão num instrumento de normalização do mundo, a ponto de se querer impor o olhar (televisivo) como detentor de uma filosofia da verdade que não admite recuo, recurso ou variações. Como quando se diz essa coisa espantosa que é: “Aceita-se este golo...” Como? Aceita-se? E não aceitando, que devemos fazer? Recomeçar o jogo? Insultar o árbitro? Invadir o campo?
Escusado será dizer que a questão, frívola nos seus sinais, mas filosoficamente decisiva no papel social da televisão, excede (e muito!) os espaços específicos do futebol. Estamos a viver um exemplo directo disso mesmo, com a agitação gerada pela divulgação de escutas que, directa ou indirectamente, envolvem personalidades da cena política. Do ponto de vista filosófico, precisamente, mas também ético e jornalístico, é espantoso verificar que o próprio facto (a publicação das escutas) seja suprimido da maior parte dos debates. Em seu lugar, triunfa a noção segundo a qual a televisão pode funcionar como uma montra transparente de exposição e, mais do que isso, de produção da verdade. É uma ambição desmedida que já foi apanágio de algumas igrejas.
No passado sábado [20 de Fevereiro], o primeiro golo do jogo Everton-Manchester United, da Premier League (SportTV), foi dos visitantes, aos 16 minutos, marcado por Berbatov. Três minutos depois, Bilyaletdinov empatou, suscitando esta observação ao comentador: “(...) Não que o Everton tenha feito muito por isso.” Quase apetece inverter o maniqueísmo da frase, acrescentando que o Everton tinha o direito de utilizar os 71 minutos que faltavam para “fazer alguma coisa por isso...” (tanto mais que conseguiu uma brilhante vitória por 3-1).
Mas não é disso que se trata. Importa mesmo insistir na recusa desse ziguezague de frases feitas que tende a reduzir as maravilhas do futebol ao cumprimento de um “destino”. Poderia até ter acontecido que o Everton tivesse jogado ainda pior do que aquilo que vemos em alguns jogos da Liga portuguesa... Qual era o problema? O que se discute, aqui, é a transformação da televisão num instrumento de normalização do mundo, a ponto de se querer impor o olhar (televisivo) como detentor de uma filosofia da verdade que não admite recuo, recurso ou variações. Como quando se diz essa coisa espantosa que é: “Aceita-se este golo...” Como? Aceita-se? E não aceitando, que devemos fazer? Recomeçar o jogo? Insultar o árbitro? Invadir o campo?
Escusado será dizer que a questão, frívola nos seus sinais, mas filosoficamente decisiva no papel social da televisão, excede (e muito!) os espaços específicos do futebol. Estamos a viver um exemplo directo disso mesmo, com a agitação gerada pela divulgação de escutas que, directa ou indirectamente, envolvem personalidades da cena política. Do ponto de vista filosófico, precisamente, mas também ético e jornalístico, é espantoso verificar que o próprio facto (a publicação das escutas) seja suprimido da maior parte dos debates. Em seu lugar, triunfa a noção segundo a qual a televisão pode funcionar como uma montra transparente de exposição e, mais do que isso, de produção da verdade. É uma ambição desmedida que já foi apanágio de algumas igrejas.