domingo, fevereiro 21, 2010

As vozes do silêncio

Um dos nomes de referência entre os compositores contemporâneos com protagonismo maior no catálogo actual da ECM, o ucraniano Valentin Silvestrov (n. 1937) tem lançado, nos últimos anos, alguns dos mais interessantes títulos da editora alemã. Depois da algo mahleriana Sinfonia Nº 6 (editada em 2007) e da espantosa colecção de pequenas peças para piano que em 2008 lançou sob o título Bagatellen und Serenaden, eis que propõe agora Sacred Works, novo disco que apresenta seis obras de música coral sacra, nas vozes do Kiev Chamber Choir, dirigido por Mykola Hobdych.

Voz rebelde no contexto da URSS musical dos anos 70 e 80, Silvestrov seguia então caminhos mais próximos da vanguarda ocidental europeia (em clara oposição ao realismo soviético favorecido pelo regime). Hoje, contudo, segue por trilhos consideravelmente distantes das vanguardas que nesses dias perseguia, juntando-se a nomes como, entre outros Arvo Part ou Giya Kanchelli, em busca de respostas num reencontro com certas tradições da música religiosa, seguindo à sua maneira uma procura maior que, no século XX, foi motriz nas obras de um Messiaen ou um Poulenc. Sacred Works é, mais que qualquer dos seus discos anteriores, uma manifestação evidente dessa demanda. Cruzam-se aqui ecos do canto litúrgico, a eles juntando-se outros interesses caros à música de Silvestrov, nomeadamente a procura de uma relação entre o silêncio e o som. De resto, entre as fronteiras do audível e o inaudível nascem linhas de contorno discreto, por vezes soando como ecos que chegam de longe. Esta é uma música que vai além do ego, procurando expressar uma identidade cultural comum. “A música é o mundo a cantar sobre si mesmo”, diz Silvestrov num texto incluído no booklet. Depois de Requiem For Larissa ou das melancólicas Silent Songs, Sacred Works é mais uma expressão de uma escrita vocal absolutamente magnífica.