Este é o registo de uma conversa com Francis Ford Coppola (Cascais, 8 de Novembro), por ocasião do Festival de Cinema do Estoril, tomando como ponto de partida a estreia portuguesa de Tetro — uma versão curta foi publicada no Diário de Notícias (14 de Novembro), com o título 'Nunca me imaginei como um realizador famoso'. [1]
Os Oscars para O Padrinho [incluindo o de melhor filme de 1972] mudaram o modo como trabalhava no interior do sistema de estúdios?
Não, porque depois de ter feito dois Padrinhos e ter ganho vários Oscars, cinco ao todo, ninguém me queria deixar fazer Apocalypse Now. Tive que pôr o meu dinheiro. E quando o fiz, toda a imprensa detestou e proclamou que se tratava de um enorme falhanço.
E que importância teve a Palma de Ouro em Cannes?
Nenhuma. Cannes não significa nada na América.
Mesmo agora?
Especialmente agora.
Depois de Apocalypse Now, surge o grande projecto de Do Fundo do Coração [1982]. Dir-se-ia que quis construir o seu próprio conceito de estúdio.
É verdade: comprei um estúdio. Sempre me senti confortável a perder dinheiro, vivi muitas aventuras que gostei de ter vivido. De facto, nunca me imaginei como um realizador famoso: via-me mais como os autores de filmes que víamos na América nos anos 60, provenientes da Europa, por exemplo da Itália, do Japão...
E, de alguma maneira, Tetro é o retorno a esse espírito?
Sim, tentando regressar ao que fazia antes de O Padrinho, já que consegui ser eu próprio a financiar o filme. Tornou-se muito difícil arranjar dinheiro para fazer um filme, a não ser que se faça um thriller, um filme de terror ou uma grande produção com Brad Pitt... Ou então qualquer coisa como Tubarão ou A Guerra das Estrelas. Por isso, para fazer um filme como Tetro, ainda por cima a preto e branco, é preciso ter o seu próprio dinheiro.
Parece-lhe que as novas técnicas digitais mudaram, de alguma maneira, a clássica questão das relações entre arte e dinheiro?
Não de forma significativa. Uma Segundo Juventude e Tetro são ambos em digital, mas creio que serão mais conhecidos pela beleza fotográfica do que por qualquer outra razão. É um pouco como as câmaras fotográficas: já não sabemos se estão a fazer fotografias em película ou digital e, de facto, não tem importância. Por exemplo, Portugal é um dos países em que Tetro vai passar em digital e, neste caso, acho que é melhor. Haverá alguns aspectos do digital que têm algum significado nos orçamentos, mas não muito: em cinema, as grandes despesas continuam a ser com o tempo, a equipa, os transportes, os hotéis, a alimentação, a gasolina... A revolução digital terá o seu impacto, em breve, mas por causa da maleabilidade do filme depois do seu acabamento: o filme não tem que ser o mesmo todas as noites. E essa é uma grande ideia, é o futuro do cinema.
E quem vai mudar o filme: o espectador?
O realizador. Como nos velhos tempos, com os compositores para as sessões de cinema mudo: não se ganhava dinheiro compondo a música, só se se dirigisse a orquestra.
Os Oscars para O Padrinho [incluindo o de melhor filme de 1972] mudaram o modo como trabalhava no interior do sistema de estúdios?
Não, porque depois de ter feito dois Padrinhos e ter ganho vários Oscars, cinco ao todo, ninguém me queria deixar fazer Apocalypse Now. Tive que pôr o meu dinheiro. E quando o fiz, toda a imprensa detestou e proclamou que se tratava de um enorme falhanço.
E que importância teve a Palma de Ouro em Cannes?
Nenhuma. Cannes não significa nada na América.
Mesmo agora?
Especialmente agora.
Depois de Apocalypse Now, surge o grande projecto de Do Fundo do Coração [1982]. Dir-se-ia que quis construir o seu próprio conceito de estúdio.
É verdade: comprei um estúdio. Sempre me senti confortável a perder dinheiro, vivi muitas aventuras que gostei de ter vivido. De facto, nunca me imaginei como um realizador famoso: via-me mais como os autores de filmes que víamos na América nos anos 60, provenientes da Europa, por exemplo da Itália, do Japão...
E, de alguma maneira, Tetro é o retorno a esse espírito?
Sim, tentando regressar ao que fazia antes de O Padrinho, já que consegui ser eu próprio a financiar o filme. Tornou-se muito difícil arranjar dinheiro para fazer um filme, a não ser que se faça um thriller, um filme de terror ou uma grande produção com Brad Pitt... Ou então qualquer coisa como Tubarão ou A Guerra das Estrelas. Por isso, para fazer um filme como Tetro, ainda por cima a preto e branco, é preciso ter o seu próprio dinheiro.
Parece-lhe que as novas técnicas digitais mudaram, de alguma maneira, a clássica questão das relações entre arte e dinheiro?
Não de forma significativa. Uma Segundo Juventude e Tetro são ambos em digital, mas creio que serão mais conhecidos pela beleza fotográfica do que por qualquer outra razão. É um pouco como as câmaras fotográficas: já não sabemos se estão a fazer fotografias em película ou digital e, de facto, não tem importância. Por exemplo, Portugal é um dos países em que Tetro vai passar em digital e, neste caso, acho que é melhor. Haverá alguns aspectos do digital que têm algum significado nos orçamentos, mas não muito: em cinema, as grandes despesas continuam a ser com o tempo, a equipa, os transportes, os hotéis, a alimentação, a gasolina... A revolução digital terá o seu impacto, em breve, mas por causa da maleabilidade do filme depois do seu acabamento: o filme não tem que ser o mesmo todas as noites. E essa é uma grande ideia, é o futuro do cinema.
E quem vai mudar o filme: o espectador?
O realizador. Como nos velhos tempos, com os compositores para as sessões de cinema mudo: não se ganhava dinheiro compondo a música, só se se dirigisse a orquestra.