e seguiu-se a uma outra que é a uniformização dos corpos."
ANTONIN ARTAUD
[citado por Philippe Sollers]
O mais recente romance de Philippe Sollers — Les Voyageurs du Temps (Gallimard) — apresenta-se como um romance sobre a própria condição do romance. Que é como quem diz: sobre o romance como ocupação do tempo. Ocupar em sentido bélico: lançar os seus exércitos e redifinir o território. E com obstinada duplicidade: transformando o tempo em narrativa e, no limite, tentando reordená-lo, isto é, submetendo-o a uma nova ordem que é, inapelavelmente, de natureza literária.
É bem certo que o autor/narrador se define por algumas peculiaridades romanescas, a mais insólita das quais será a sua prática regular do tiro ("Venho do Centro de tiro..."). Há uma mulher, de nome Viva (hélas!), que ele conhece nos rituais dessa prática e com quem estabelece um protocolo erótico tão depurado que apetece apelidá-lo de cartesiano. Em todo o caso, tudo tem a ver com essa viagem que o título anuncia e que, de forma linear, podemos definir como uma viagem através da literatura — enfim, da escrita.
Daí que Les Voyageurs du Temps se possa descrever como uma admirável derivação da arte clássica da citação (nada fácil, lembra Sollers aos mais incrédulos), convocando Proust e Céline, Glenn Gould e a Europa (encore, hélas!) para fazer a autópsia de uma cultura que passou a menosprezar o poder da escrita. Exemplo? Já perto do final, esta silhueta rápida: "Ela é música e bailarina, sem falar do resto." Não, já não é Viva, mas Sophie.
>>> Site oficial de Philippe Sollers.