Vincent van Gogh
Camponesa
1885
Eram 20h23 de domingo, dia 27, quando, na RTP1, Marcelo Rebelo de Sousa resumiu as previsões eleitorais através de um novo conceito: o de que as sondagens dos últimos dias geram um efeito de clonagem (a palavra é minha) e que, por isso, os eleitores tendem a favorecer quem vai à frente, adoptando uma atitude de “Maria vai com as outras” (as palavras são do comentador). Num ápice, Marcelo Rebelo de Sousa conseguiu duas coisas tristes: primeiro, desvalorizar o trabalho das televisões que, apesar do populismo das programações, tentam compreender os movimentos sociais; segundo, legitimar a suposição de que muitos eleitores portugueses são imaturos.
Que contraponto tivemos para contrariar esta ligeireza? Em boa verdade, não foi fácil orientarmo-nos. Por um lado, as televisões investiram na criação de aparatos visuais que, para além do “conteúdo”, sugerissem uma “forma” mais ou menos sofisticada e futurista. Por outro lado, importa perguntar se essa agitação das imagens (e dos sons) gera pertinência informativa e precisão analítica. De facto, a profusão de números e gráficos favoreceu, por vezes, um barroquismo desmobilizador: quando uma imagem se limita a ostentar uma lógica de acumulação, o desejo de olhar vai-se anulando.
Aliás, voltando às palavras de Marcelo Rebelo de Sousa, importa dizer em sua defesa que ele se limita a encarnar um modelo de comunicação (?) que se tornou dominante: o de que é preciso dizer num brevíssimo instante aquilo que, eventualmente, levou horas a pensar ou uma vida inteira a encontrar. Por mim, como espectador, gostava de não ver profissionais talentosos a correr atrás de políticos, “exigindo-lhes” que digam numa fracção de segundo aquilo que, afinal, não têm gosto em dizer.