Este texto foi publicado no suplemento DN Gente, na edição de 1 de Agosto, com o título “Quando velhas memórias ganham nova vida”
Apresentam-se como Jonsi & Alex. Partilham a vida no dia-a-dia e, desde 2003, trabalham conjuntamente num projecto artístico que começou por explorar as artes visuais e que, agora, se apresenta na forma de música através do álbum Riceboy Sleeps. Juntos já criaram capas de discos, peças que apresentaram em exposições e até publicaram um livro de receitas, com os seus pratos caseiros, que se pode "folhear" no seu site oficial revelando os segredos por trás de um creme de espinafres, o molho de alho, caril de coco, pesto de pinhões ou tarte de morangos. Receitas saudáveis e vegetarianas.
Jonsi, na verdade Jón Thor Birgisson, não é mais que o vocalista do grupo islandês Sigur Rós, um dos mais respeitáveis nomes do rock alternativo da presente década. Aos 34 anos é um músico de talento reconhecido. É certo que os dois primeiros discos dos Sigur Rós - Vón (1997) e Vón Brigdi (álbum de remisturas, de 1998) - passaram a leste das atenções ao largo da Islândia. Mas com Agaétis Byrjun (1999, com lançamento global em 2000) tornaram-se numa das revelações de uma nova década que dava os primeiros passos ao som das suas canções contemplativas nas quais paisagens para cordas vivem de mãos dadas com a intensidade da electricidade. Seguiram-se outros discos e uma banda sonora. Pelo caminho colaboraram com o recentemente falecido Merce Cunningham, percorreram o mundo subindo a muitos palcos e foram protagonistas de um documentário a que chamaram Heima. Alto, magro, discreto no olhar, sempre afável nas palavras, vegetariano na hora de se sentar à mesa, Jonsi venceu ao longo da década uma certa timidez que dele raras vezes fez porta-voz do grupo nos dias de Agaétis Byrjun.
Alex, que hoje vive em Reiquejavique (Islândia) com Jonsi, também tem uma vivência musical anterior a esta parceria. De seu nome completo Alex Somers, tem naturalidade norte-americana e milita desde 2003 no colectivo Parachutes, que, inicialmente sendo um duo, alberga hoje a participação de oito músicos. Ensaiam e gravam na sua cozinha e já assinaram trabalhos de colaboração com os Sigur Rós e o quarteto Amina.
Conheceram-se em Boston, por ocasião de um concerto dos Sigur Rós. Foi o irmão de Alex quem primeiro falou com Jonsi, dando-lhe um CD da banda deste. Num regresso a Boston, um novo encontro juntou-os. Mantiveram-se em contacto, por e-mail, viajando entre os Estados Unidos e a Islândia. Até ao dia em que Alex decidiu mudar-se de armas e bagagens para Reiquejavique.
A colaboração profissional entre o par vai já no sexto ano de vida. Os seus primeiros trabalhos encontraram matéria-prima em objectos que descobriam em ferros-velhos e depois transformaram em peças pelas quais cruzaram sobretudo memórias dos seus dias de infância. Desde então juntam livros antigos, fotografias, acrescentam-lhes desenhos... Numa entrevista recente Jonsi explicou que ambos partilham um amor por tudo o que esteja a cair aos pedaços.
Lançaram um livro em 2006. Trabalharam em várias exposições. Criaram trabalhos em vídeo. Em cada objecto reconhecem memórias, que assim captam e preservam, dando-lhes nova vida. E agora aplicam o mesmo conceito à música. Há alguns meses, na compilação Dark Was The Night (da Red + Hot Organization), revelavam uma primeira composição. Riceboy Sleeps leva agora o desafio mais longe, num álbum feito de músicas contemplativas capazes de traduzir as mesmas sensações produzidas pela obra visual que criam a dois.
Entretanto há já um novo disco de Sigur Rós na calha. E mais uma exposição conjunta em Londres. E certamente novas receitas a inventar (e registar depois em livro), fruto do quotidiano numa casa islandesa onde não há aparelhos de televisão. Mas onde não faltam os discos, sejam de jazz ou, como Jonsi já confessou, de pop muito... má!
Imagens de um EPK (electronic press kit) promocional que apresenta o álbum ‘Riceboy Sleeps’, com entrevistas a Jonsi e Alex, juntando ainda fragmentos da música do álbum e algumas imagens do seu processo de gravação.