quarta-feira, julho 01, 2009

A auto-estrada de Ursula Meier

Cena do quotidiano familiar: a mãe (Isabelle Huppert) acompanha os filhos à paragem do autocarro, a caminho da escola. Com esse pormenor insólito: a rua que atravessam é, de facto, uma auto-estrada. Mais ainda: a casa da família fica a dois passos, literalmente, da própria auto-estrada... Cena do magnífico filme de Ursula Meier — Home - Lar Doce Lar —, insólito e fascinante objecto de cinema que se coloca no coração de uma ansiedade muito contemporânea: na saturação/banalização das imagens em que vivemos, como garantir o efeito de real do cinema?
Trata-se, afinal, de criar um curto-circuito formal entre a evidência do espaço familiar e a dantesca ilegibilidade que o ruído dos carros instala nesse espaço. A ponto de a sinopse poder ser, simples e desarmante: 1: família vulgar / 2: abalada pelo ruído da auto-estrada / 3: tenta calafetar a sua casa / 4: e reconquistar o silêncio. Daí nasce uma espécie de fábula sobre uma heroicidade que já ninguém sabe enunciar, dentro de um real cujos contornos ninguém pode garantir. Tudo tão íntimo e tão absurdo.
Em termos simples, esta auto-estrada de destino não esclarecido é o caminho para aquele que é, para já, o grande acontecimento do Verão cinematográfico.

>>> Home: site + blog.