Recentemente premiado com o Oscar de melhor documentário, Homem no Arame, de James Marsh, evoca uma proeza única: a travessia, em arame, entre as Torres Gémeas do World Trade Center — este texto foi publicado no Diário de Notícias (5 de Março), com o título 'O novo regresso da grande aventura'.
Pelas imagens de Homem no Arame perpassa um perturbante silêncio. Nada se diz, nada se mostra sobre os atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001: o desafio de Philippe Petit é vivido num cenário de Nova Iorque (World Trade Center) que sabemos já não existir. Para além de se tratar de uma proeza concretizada há mais de 30 anos, creio que há uma razão de fundo para que o filme de James Marsh opte por tal silêncio. O feito de Petit não procura integrar-se na história dos factos ou, se quisermos jogar com as palavras, nos factos enquanto elementos geradores de história. A sua aposta em fazer a travessia em arame, no alto das Torres Gémeas, existe como um gesto sem conteúdo, por assim dizer anti-histórico. Aliás, depois de consumada a travessia, a pergunta inevitável (“porquê?”) apenas lhe suscita uma discreta ironia.
Daí esta situação desconcertante: por um lado, temos um herói que se basta a si próprio, um verdadeiro símbolo abstracto que resiste a ser “normalizado”; por outro lado, Homem no Arame é um documentário, quer dizer, um objecto que aposta em mostrar o concreto e o vivido. Dessa ambivalência nasce um singular reencontro com a grande aventura. É certo que a expressão (“o regresso da grande aventura”) tem dono: serviu, em 1981, para promover a primeira aventura de Indiana Jones, Os Salteadores da Arca Perdida. Mas o cinema é feito destas contradições: entre a verdade da dimensão humana e os artifícios da sua imaginação, as fronteiras podem ser tão finas como um arame.
Pelas imagens de Homem no Arame perpassa um perturbante silêncio. Nada se diz, nada se mostra sobre os atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001: o desafio de Philippe Petit é vivido num cenário de Nova Iorque (World Trade Center) que sabemos já não existir. Para além de se tratar de uma proeza concretizada há mais de 30 anos, creio que há uma razão de fundo para que o filme de James Marsh opte por tal silêncio. O feito de Petit não procura integrar-se na história dos factos ou, se quisermos jogar com as palavras, nos factos enquanto elementos geradores de história. A sua aposta em fazer a travessia em arame, no alto das Torres Gémeas, existe como um gesto sem conteúdo, por assim dizer anti-histórico. Aliás, depois de consumada a travessia, a pergunta inevitável (“porquê?”) apenas lhe suscita uma discreta ironia.
Daí esta situação desconcertante: por um lado, temos um herói que se basta a si próprio, um verdadeiro símbolo abstracto que resiste a ser “normalizado”; por outro lado, Homem no Arame é um documentário, quer dizer, um objecto que aposta em mostrar o concreto e o vivido. Dessa ambivalência nasce um singular reencontro com a grande aventura. É certo que a expressão (“o regresso da grande aventura”) tem dono: serviu, em 1981, para promover a primeira aventura de Indiana Jones, Os Salteadores da Arca Perdida. Mas o cinema é feito destas contradições: entre a verdade da dimensão humana e os artifícios da sua imaginação, as fronteiras podem ser tão finas como um arame.