1934, Nuremberga: Heinrich Himmler, chefe das SS nazis, e Leni Riefenstahl,
durante a rodagem de O Triunfo da Vontade
durante a rodagem de O Triunfo da Vontade
No Centro Cultural de Belém, incluído no ciclo 'O Nazismo e a Cultura: Con-frontações' (a decorrer até 1 de Março), foram apresentados alguns filmes que, directa ou indirectamente, remetem para o contexto histórico em análise. Enquanto responsável pela selecção desses filmes, apresentei a sessão de O Triunfo da Vontade (1935), de Leni Riefenstahl (14 de Fevereiro, 19h00) — este é o texto lido nessa apresentação.
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Normalmente, o conhecimento e a discussão das contradições da trajectória de Riefenstahl são enquadrados por um dicotomia clássica: precisamente a que contrapõe a “arte” à “política”.
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Normalmente, o conhecimento e a discussão das contradições da trajectória de Riefenstahl são enquadrados por um dicotomia clássica: precisamente a que contrapõe a “arte” à “política”.
Vendo as coisas por esse prisma, torna-se inevitável lembrar dois dados básicos. Primeiro, que Riefenstahl, muito antes de Michael Moore (e não estou, como é óbvio, a sugerir nenhuma equivalência entre ambos), foi alguém que concebeu e trabalhou o dispositivo documental, não como uma “reprodução” automática seja do que for, mas sim como uma reconfiguração material e estética de um determinado acontecimento. De facto, muitos dos aspectos de encenação do Congresso Nazi – desde os espaços para a passagem das tropas até à colocação de Hitler na tribuna dos discursos – foram coordenados pela própria Riefenstahl em estreita relação com o imenso aparato de câmaras que ela teve ao seu dispor. Não é muito cómodo dizê-lo, mas esta contaminação entre “realidade” e “ficção” confere-lhe uma dimensão eminentemente moderna, essencial para analisarmos, por exemplo, muitas das formas televisivas que hoje consumimos.
Depois, é evidente que a “arte” não pode ser nunca dissociada da “política”. E não só porque se possam fazer filmes ao serviço da força política A, B ou C. Sobretudo, ou antes de tudo o mais, porque filmar o mundo é reconfigurar as suas evidências e os seus mistérios, quer dizer, elaborar retratos, discursos, modelos de percepção e pensamento – em duas palavras: fazer política.
Depois, é evidente que a “arte” não pode ser nunca dissociada da “política”. E não só porque se possam fazer filmes ao serviço da força política A, B ou C. Sobretudo, ou antes de tudo o mais, porque filmar o mundo é reconfigurar as suas evidências e os seus mistérios, quer dizer, elaborar retratos, discursos, modelos de percepção e pensamento – em duas palavras: fazer política.
[continua]