"Sua Majestade", diz o título — Catherine Deneuve está na capa da edição de Novembro/Dezembro da Film Comment (publicação da Film Society of Lincoln Center). O pretexto próximo é o lançamento do magnífico Un Conte de Noël, de Arnaud Desplechin, momento alto do último Festival de Cannes.
A revista publica uma entrevista com Deneuve conduzida pelo próprio Desplechin. Aliás, mais do que uma entrevista, trata-se de uma conversa atravessada por múltiplas cumplici-dades, evocando muitos momentos marcantes da trajectória da actriz: a viragem profissional, em 1964, com Os Chapéus de Chuva de Cherburgo [foto] e o conhecimento de Jacques Demy; a relação mais forte com os realizadores e o relativa ausência de "modelos" ou "referências" entre as actrizes (excepção: Marilyn Monroe); a integração no universo de Luis Buñuel através de Belle de Jour (1967) e Tristana (1970), preferindo o segundo contra o primeiro; a evocação do projecto não concretizado com Alfred Hitchcock...
São memórias despidas de qualquer lamentação nostálgica. Deneuve não se vê como protagonista de uma "carreira", antes como alguém que persiste numa atitude de descoberta face ao cinema e através dos filmes. Desplechin diz, aliás, que sempre a viu como alguém que, no interior de cada filme, afirma um ponto de vista. Ela própria o confirma, quando diz: "(...) nunca frequentei a escola de repre-sentação e nunca estudei com actores. Apenas os encontro nas rodagens — de facto, nunca tive amizades com actores, à excepção da minha irmã [Françoise Dorléac]. Sempre me senti do lado do realizador e do argumentista. Não escolhi assim, apenas aconteceu."