Confesso que não vejo com fre-quência os noticiários da TVI. Se há uma deriva populista em muitas formas de informação (de todos os canais, infelizmente), a TVI parece-me ser o caso extremo de tal fenómeno. Sobretudo, não me é fácil aceitar que os mais bizarros fait divers adquiram tanta (ou mais) importância que as convulsões realmente graves do planeta em que vivemos.
Hoje, ao acompanhar durante alguns minutos o Jornal Nacional, deparei com o drástico agravamento de tal conjuntura. De facto, a maioria das notícias passaram a ser redigidas — e lidas! — em tom de assumido sarcasmo, como se tentar compreender a diversidade do mundo fosse transformar tudo em evento pitoresco ou cenário a-nedótico. Por exemplo, a notícia sobre a distribuição dos computado-res "Magalhães" chegava ao ponto de se dirigir, ironicamente (?), a José Sócrates ("Sr. Primeiro-Ministro"...), como quem interpela o parceiro de uma conversa fútil à mesa do café. Quero acreditar que mesmo o mais severo crítico da política educacional do Governo não se pode reconhecer no festivo simplismo deste modo de fazer "informação".
Repare-se: nada disto tem a ver com o facto de poder existir um jornalismo que, além de procurar informar, tenha pontos de vista e os sustente de modo cristalino e frontal. Que venha esse jornalismo que pensa e faz pensar. O que está em causa é de outra natureza: é a crescente degradação dos padrões jornalísticos dominantes, contribuindo cada vez mais para que a profissão de informar seja confundida com a construção de discursos mais ou menos anedóticos, discursos que, implicitamente, favorecem a des-responsabilização de quem informa e a irresponsabilidade de quem é informado.
Que a esmagadora maioria da classe jornalística não reaja, todos os dias, a estes atentados aos seus valores mais genuínos, eis o mistério filosófico dos nossos dias televisivos.