O disco apareceu há cerca de três meses. Tem andado por aí, sem se estranhar, mas entranhando-se... Dizer que reencontramos na voz e na arte de Aldina Duarte a sublime herança de Amália é, talvez, necessário, mas insuficiente — sobretudo porque não se trata de defender que ela se "parece" com Amália.
Aldina é um caso único e genuíno. Acontece que ela mantém o seu canto e a sua sensibilidade em linha directa com a dimensão mais primitiva do fado, dimensão que talvez possamos situar, justa-mente, entre os pólos definidos por Marceneiro e Amália. É uma atitude que dispensa o reformismo do "como é que podemos fazer evoluir o fado?" Que é como quem diz: decorre de um processo criativo que se alheia de qualquer modernismo, afirmando-se face ao pulsar original do fado como eminentemente conservador. Não se trata de "fazer evoluir" o fado pela simples razão de, aqui, ninguém o encarar ou sentir como coisa retrógrada. Para aplicarmos uma palavra adequada, diremos que Aldina se revê — e a todos os instantes reinventa — num espelho que a faz existir como o caso mais sério e fascinante do canto em português.
Mulheres ao Espelho é um álbum sobre tudo isso — e, como é óbvio, sobre o conjugar disso tudo na transparência enigmática do feminino. Penetramos num universo em que as palavras parecem sempre em défice face à convulsão dos corações, não sem que essas mesmas palavras exibam uma serenidade de cristal. Aldina diz cada sílaba como se, no seu dizer, se comprometesse toda a vulnerabili-dade do universo. Afinal de contas, ela é também autora de vários poemas destes fados e escreve, por exemplo, em Princesa Prometida:
Aldina é um caso único e genuíno. Acontece que ela mantém o seu canto e a sua sensibilidade em linha directa com a dimensão mais primitiva do fado, dimensão que talvez possamos situar, justa-mente, entre os pólos definidos por Marceneiro e Amália. É uma atitude que dispensa o reformismo do "como é que podemos fazer evoluir o fado?" Que é como quem diz: decorre de um processo criativo que se alheia de qualquer modernismo, afirmando-se face ao pulsar original do fado como eminentemente conservador. Não se trata de "fazer evoluir" o fado pela simples razão de, aqui, ninguém o encarar ou sentir como coisa retrógrada. Para aplicarmos uma palavra adequada, diremos que Aldina se revê — e a todos os instantes reinventa — num espelho que a faz existir como o caso mais sério e fascinante do canto em português.
Mulheres ao Espelho é um álbum sobre tudo isso — e, como é óbvio, sobre o conjugar disso tudo na transparência enigmática do feminino. Penetramos num universo em que as palavras parecem sempre em défice face à convulsão dos corações, não sem que essas mesmas palavras exibam uma serenidade de cristal. Aldina diz cada sílaba como se, no seu dizer, se comprometesse toda a vulnerabili-dade do universo. Afinal de contas, ela é também autora de vários poemas destes fados e escreve, por exemplo, em Princesa Prometida:
Há um véu no meu olhar
Que a brilhar dá que pensar
Nos mistérios da beleza
Espelho meu que aconteceu
Do que é teu e do que é meu
Já não temos a certeza
Maria do Rosário Pedreira assina alguns dos poemas e lê um deles (Mãe) no final do disco, transpondo a sua voz para uma intensidade paradoxalmente contida a que, sem ironia, chamaremos fadista. José Manuel Neto (guitarra) e Carlos Manuel Proença (viola) fazem também aquilo que a tradição impõe: recusando qualquer prota-gonismo estilístico, desenham a paisagem onde a voz pode fazer viver as suas formas mais ocultas. Aldina Duarte é a sublime explicitação desse segredo que, por pudor, se não diz — mas canta.
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>>> Editora Roda-Lá Music.
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