domingo, agosto 24, 2008

Um caso de "pirataria" bem antes da pop

Usar boas ideias e estratégias para cativar uma plateia não é coisa que tenha nascido com a cultura pop. Veja-se um caso que nos remete à Londres do século XVIII. George Frideric Handel (1685-1759), alemão de nascença, e cidadão britânico depois de 1727, tinha já residência fixa em Londres desde 1712. Reconhecido na época como a principal força musical da Inglaterra de então, mas ciente da necessidade de apostar no trabalho e na opção pela novidade para não perder o estatuto, usou a sua reconhecida fama como grande organista em favor das apresentações ao vivo de novas obras, muitas delas oratórios. A fama de organista revelava-se contudo no programa complementar aos oratórios, na forma de uma série de concertos para órgão, nos quais ele mesmo se apresentava como solista, que, de facto, atraíram vastas plateias. Crê-se que a primeira vez que Handel usou esta estratégia para cativar público com um concerto para órgão complementar terá acontecido em Oxford, em 1733, quando estreou o oratório Esther. Dois anos depois, numa apresentação londrina do mesmo oratório, Handel fez bom uso da imprensa, anunciando nos jornais, que haveria um concerto como adenda ao programa principal. Resultado: casa cheia. E durante os dois anos seguintes, o compositor incluiu novos concertos para órgão nos intervalos de novas peças corais. O sucesso traduziu-se ainda num dos primeiros casos de “pirataria” da história da música. A 25 de Setembro de 1735 o London Daily Post publicava uma notícia na qual se dava conta da publicação, sem o consentimento do autor, e com incorrecções, dos concertos para órgão de Handel... A mesma notícia revelava que, com autorização (e revisão) do compositor, havia à venda, então, novas partituras das mesmas obras... É com base nestas partituras “legais” que a Academy Of Ancient Music, tendo como solista o organista Richard Egarr, preparou este disco que, agora editado pela Harmonia Mundi, recupera seis desses magníficos Concertos para órgão Op. 4, que Handel compôs na Inglaterra da década de 30 do século XVIII. Em todos eles fica clara a sugestão da necessidade do aprumo técnico do organista mas, não menos importante, a certeza do domínio da arte da orquestração em Handel.