O filme está, contudo, longe de ser um desfile bem montado de entrevistas. Escutando atentamente os depoimentos recolhidos, Grant Gee compreendeu que a música (e breve carreira) dos Joy Division é em grande parte uma consequência do espaço e tempo onde tudo aconteceu. Manchester, cidade "cinzenta" no centro de Inglaterra, com história operária que remonta aos dias da Revolução Industrial, aí definindo uma personalidade sociológica e cultural muito particular é, mais que mero palco que assiste à acção, a "mãe" do que ali aconteceu em finais de 70.
A memória de um mítico concerto dos Sex Pistols, em 1976, no Free Trade Hall de Manchester, é inevitável ponto de partida para a história que se conta. Mas tudo o que depois acontece, do formar da banda à aventura da gravação e edição, em tudo reflecte as marcas da cidade. Que não só se traduzem nos comportamentos dos músicos. Como são visíveis na música, verdadeira banda sonora para um espaço urbano fechado, sem horizontes, algo opressivo... Bernard Sumner lembra que Ian Curtis era um homem especial, com personalidade em grande parte definida pelas rotinas do quotidiano mas também pelos livros que leu e assimilou. Desmitificando um qualquer "grande plano", o baixista Peter Hook lembra, todavia, que "ser profundos" não era destino na agenda do grupo. Queriam, apenas, tocar e entusiasmar quem os ouvia. O filme sabe, por isso, mostrar como do acaso nascem alguns mitos.
PS. Versão editada de texto publicado a 15 de Julho no DN