A percepção da vida económico-financeira do cinema é cada vez mais superficial, até mesmo anedótica. Responsáveis principais disso são as notícias (?) que fazem crer que é possível compreender os altos e baixos da indústria a partir do valor absoluto das receitas, sobretudo das receitas do mercado americano. Informações provenientes de um dos principais órgãos informativos do cinema dos EUA, The Hollywood Reporter, trazem-nos dois exemplos reveladores.
O primeiro tem a ver com as receitas de O Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan, que se tornou o filme a atingir mais rapidamente o valor de 300 milhões de dólares no mercado americano. De facto, apesar de tal performance, as acções do grupo Time Warner (no qual se inclui a Warner Bros., produtora do filme) não só não subiram, como desceram (de 14,70 dólares para 14,57) depois de conhecidos os números do dia da estreia.
O segundo exemplo tem a ver com a situação de impasse em que se encontra Che [imagem em cima], o filme de Steven Soderbergh sobre Che Guevara. Apesar do seu impacto no Festival de Cannes (onde Benicio Del Toro arrebatou mesmo o prémio de interpretação masculina), Che continua sem distribuidor nos EUA. É óbvio que a sua duração superior a 4 horas e o facto de a maioria dos diálogos serem em espanhol não facilita a carreira comercial do filme, mesmo se simbolicamente o podemos considerar um produ-to "independente" (o seu orçamento de 65 milhões de dólares, sendo alto, corresponde a um valor mediano para os grandes estúdios). Seja como for, este é mais um sintoma de uma realidade bem mais complexa do que muitas manchetes podem fazer crer — a economica cinematográfica nunca é linear.