Para onde vai o humor português? Ou de onde vem? Que raízes o sustentam? Que modelos o influenciam? Em particular: o que é — ou pode ser — um humor especificamente televisivo? Este texto foi publicado no Diário de Notícias (6 de Maio), com o título 'O tempo da comédia'.
Não tenho uma visão entusiasta da recente “revolução” da stand-up comedy no humor português e, mais especificamente, no humor televisivo. E não tanto pelas inevitáveis razões de “qualidade” (afinal, é desse registo que vem alguém tão talentoso como Bruno Nogueira). Antes porque tal proliferação funcionou como uma banalização do próprio trabalho de fazer comédia. No limite, assistimos a essa coisa penosa que consiste em “promover” o cómico em frente do microfone a mero duplo do cidadão anónimo que, num qualquer serão caseiro, conta anedotas obscenas para animar a família... De facto, a eventual boa disposição familiar não basta para organizar um espectáculo consistente, seja ele humorístico ou dramático.
Faltava-nos, por isso, algo ou alguém que devolvesse à comédia o seu tempo particular, esse jogo de durações e ritmos que está muito para além da colagem de gags mais ou menos inspirados. Faltava-nos, sobretudo, uma série que aplicasse as potencialidades técnicas e narrativas da televisão, em vez de se ficar pela solução preguiçosa de “reproduzir” gags sem qualquer articulação criativa com o meio que utilizam. Temos agora, felizmente, Os Contemporâneos (RTP1: domingo, 21h30).
No ecrã, Os Contemporâneos são oito presenças (Bruno Nogueira, Maria Rueff, Nuno Lopes, Gonçalo Waddington, Carla Vasconcelos, Dinarte Branco, Eduardo Madeira e Nuno Markl) que fazem um humor que passa sempre por uma metódica atenção às coordenadas cénicas da própria televisão. Repare-se, por exemplo, nos quadros de abertura e no seu calculado jogo com o espaço branco do estúdio. Repare-se também no modo como isso pode gerar experiências de magnífico absurdo (no último episódio, a personagem interpretada por Maria Rueff: uma mulher que espalha a “palavra do Senhor” sem saber... que palavra é essa!).
Daí nasce um efeito paradoxal: há uma abstracção formal em Os Contemporâneos que não exclui, antes atrai, muitos dados que remetem para o nosso quotidiano. Neste último episódio, a caricatura dos “adeptos” da selecção de futebol foi um excelente antídoto contra a histeria mediática em que, em nome de um “patriotismo” simplista, nos querem mergulhar.
Não tenho uma visão entusiasta da recente “revolução” da stand-up comedy no humor português e, mais especificamente, no humor televisivo. E não tanto pelas inevitáveis razões de “qualidade” (afinal, é desse registo que vem alguém tão talentoso como Bruno Nogueira). Antes porque tal proliferação funcionou como uma banalização do próprio trabalho de fazer comédia. No limite, assistimos a essa coisa penosa que consiste em “promover” o cómico em frente do microfone a mero duplo do cidadão anónimo que, num qualquer serão caseiro, conta anedotas obscenas para animar a família... De facto, a eventual boa disposição familiar não basta para organizar um espectáculo consistente, seja ele humorístico ou dramático.
Faltava-nos, por isso, algo ou alguém que devolvesse à comédia o seu tempo particular, esse jogo de durações e ritmos que está muito para além da colagem de gags mais ou menos inspirados. Faltava-nos, sobretudo, uma série que aplicasse as potencialidades técnicas e narrativas da televisão, em vez de se ficar pela solução preguiçosa de “reproduzir” gags sem qualquer articulação criativa com o meio que utilizam. Temos agora, felizmente, Os Contemporâneos (RTP1: domingo, 21h30).
No ecrã, Os Contemporâneos são oito presenças (Bruno Nogueira, Maria Rueff, Nuno Lopes, Gonçalo Waddington, Carla Vasconcelos, Dinarte Branco, Eduardo Madeira e Nuno Markl) que fazem um humor que passa sempre por uma metódica atenção às coordenadas cénicas da própria televisão. Repare-se, por exemplo, nos quadros de abertura e no seu calculado jogo com o espaço branco do estúdio. Repare-se também no modo como isso pode gerar experiências de magnífico absurdo (no último episódio, a personagem interpretada por Maria Rueff: uma mulher que espalha a “palavra do Senhor” sem saber... que palavra é essa!).
Daí nasce um efeito paradoxal: há uma abstracção formal em Os Contemporâneos que não exclui, antes atrai, muitos dados que remetem para o nosso quotidiano. Neste último episódio, a caricatura dos “adeptos” da selecção de futebol foi um excelente antídoto contra a histeria mediática em que, em nome de um “patriotismo” simplista, nos querem mergulhar.