quinta-feira, março 27, 2008

Dylanesco

É isto que faz com que I'm Not There esteja no coração vivo, vi-víssimo, da mais fascinante, ousada e livre arte contemporânea.
Porquê? Porque à esquerda temos Bob Dylan, o verdadeiro Bob Dylan, numa imagem de meados dos anos 60 — como a história o registou. Porque à direita temos Bob Dylan, isto é, Cate Blanchett a representar verdadeiramente o verdadeiro Bob Dylan — como a ficção o pode mostrar e reinventar.
Dito de forma mais crua, cruamente política: esqueçam as impos-turas televisivas da "fidelidade" aos factos e da "reconstituição" dos mesmos. Basta dessas mentiras piedosas que, em última instância, massacram o tecido social — e a inteligência de cada cidadão — com a miséria formal, temática e existencial das telenovelas. O novo filme de Todd Haynes é sobre essa liberdade de Cate Blanchett ser uma emanação de Bob Dylan e, no entanto, não deixar de ser... Cate Blanchett — é um filme sobre o prazer de sabermos que a realidade se faz também dessa ambivalência sem solução. Para ver e rever.