No Direction Home aí está, finalmente, como um esplendoroso acontecimento musical & cinematográfico — o filme de Martin Scorsese sobre Bob Dylan, agora disponível em DVD (Paramount/Lusomundo) é a prova real de que, hoje em dia, é possível encontrar formas singulares de expressão que apostem na aliança das mais variadas linguagens e modelos de produção sem alienar uma singularíssima visão criativa.
Produzido pela PBS (televisão pública dos EUA), No Direction Home funciona, à partida, como uma antologia de memórias biográficas: Scorsese entrevista Dylan na actualidade, ao mesmo tempo que, tirando partido de muitos documentos inéditos (em grande parte provenientes dos arquivos pessoais de Dylan), vai elaborando um retrato do cantor, músico e poeta que desempenhou um papel central nas transformações culturais dos míticos e agitados sixties. Cedo se percebe, no entanto, que Scorsese está muito longe de se limitar a cumprir a vulgar lógica de exaltação do biografado. Desde logo, porque No Direction Home termina muito cedo, no ano de 1966, quando Dylan, ao integrar guitarras eléctricas na sua tournée britânica, abalou de modo irreversível as estruturas clássicas da música folk. Mais do que isso, assistimos à lenta, subtil e fascinante elaboração de um retrato para sempre ambivalente: Dylan é aquele que reage contra a própria lenda que o quer «catalogar», ao mesmo tempo que Scorsese nele revela as convulsões internas de uma América a lutar pela difícil conciliação com os traumas da sua própria história.
Filme-filme? Documentário televisivo? Retrato cinematográfico? Tudo isso e mais ainda: um exercício de cruzamento de linguagens que fica, sem qualquer hesitação, como um dos acontecimentos maiores entre as imagens e os sons de 2005.
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Produzido pela PBS (televisão pública dos EUA), No Direction Home funciona, à partida, como uma antologia de memórias biográficas: Scorsese entrevista Dylan na actualidade, ao mesmo tempo que, tirando partido de muitos documentos inéditos (em grande parte provenientes dos arquivos pessoais de Dylan), vai elaborando um retrato do cantor, músico e poeta que desempenhou um papel central nas transformações culturais dos míticos e agitados sixties. Cedo se percebe, no entanto, que Scorsese está muito longe de se limitar a cumprir a vulgar lógica de exaltação do biografado. Desde logo, porque No Direction Home termina muito cedo, no ano de 1966, quando Dylan, ao integrar guitarras eléctricas na sua tournée britânica, abalou de modo irreversível as estruturas clássicas da música folk. Mais do que isso, assistimos à lenta, subtil e fascinante elaboração de um retrato para sempre ambivalente: Dylan é aquele que reage contra a própria lenda que o quer «catalogar», ao mesmo tempo que Scorsese nele revela as convulsões internas de uma América a lutar pela difícil conciliação com os traumas da sua própria história.
Filme-filme? Documentário televisivo? Retrato cinematográfico? Tudo isso e mais ainda: um exercício de cruzamento de linguagens que fica, sem qualquer hesitação, como um dos acontecimentos maiores entre as imagens e os sons de 2005.