O segundo álbum dos GNR, Defeitos Especiais (EMI, 1984) é, porque nunca editado em CD, uma das mais injustamente “esquecidas” pérolas da pop portuguesa de 80. Seguro sucessor do magnífico Independança (Valentim de Carvalho, 1982, disco recentemente reeditado em CD), reflecte a opção por caminhos pop atentos ao presente estético que se adivinhava já em canções da face A de Independança. É também um álbum ciente da escrita (e voz) de grande personalidade de Rui Reininho. O disco afirmava, por outro lado, o afastamento do grupo face a eventuais novos cenários de vanguardismo pop (como haviam feito em Avarias, do primeiro álbum), as novas experiências sendo lançadas ao serviço da canção. Defeitos Especiais não é, contudo, um álbum de desistência nessa mesma frente da invenção, reflectindo muitas das suas canções um gosto pelo ensaio de molduras desafiantes, assegurando o alinhamento uma coexistência esteticamente cativante entre momentos de ensaio formal (como no belíssimo híbrido de tempero “mouro”, de travo fadista – com, inclusivamente, uma citação da Canção do Mar - , de Muçulmania, na utilização curiosa das electrónicas em A Última Vaga ou na exploração da voz falada no contagiante Pershingopolis) e opções por modelos mais radio friendly (mesmo assim atentos aos códigos das linhas da frente do seu tempo), como se escutava em Desnorteado, Mau Pastor ou I Don’t Feel Funky Anymore. Esta última canção, escolhida como single, representa o único instante do álbum não cantado em português. De certa forma, este tema assegura uma ponte directa com o álbum de estreia, nomeadamente com o bem sucedido single dele extraído, Hardcore (1º Escalão). Em 2002, em declarações ao DNmais, Rui Reininho explicava este álbum num contexto que decorria da saída de Vítor Rua (para os Telectu) e da crise, leia-se mesmo ressaca, que então se abatia sobre o pop/rock português. Num ano quase sem concertos, para os GNR e demais bandas portuguesas, apontou este como o álbum “mais Rock Rendez Vous” do grupo, porque foi essa a sala onde então mais tocaram. Sem perspectivas de palco nem de vendas, optaram por gravar um álbum para a satisfação dos músicos e dos fãs. Acertaram. E em Defeitos Especiais têm um dos seus mais interessantes discos.GNR
Defeitos Especiais (EMI, 1984)
Produção: Pedro Vasconcelos e GNR
Lado A: Desnorteado + I Don’t Feel Funky Anymore + Piloto Automático + Absurdina + A Última Vaga
Lado B: Muçulmana + Mau Pastor + Pershingopolis + Quebra Gelo + Maré Baixa