segunda-feira, agosto 20, 2007

Discos da semana, 20 de Agosto

Dois motivos podem justificar a expectativa que aguardava a chegada da banda sonora de Hallam Foe, filme de David McKenzie, apresentado este ano na Berlinale e que, finalmente, começa a chegar ao circuito comercial. Um deles, o facto de se saber que seria um álbum feito da recolha de canções em discos editados pela mui distinta independente britânica Domino Records. Mas mais que este, o segundo motivo bastaria por si, já que a notícia da inclusão de um inédito dos Franz Ferdinand (a única nova gravação deste disco) no alinhamento justifica a curiosidade. Curiosidade, podemos dizer agora, compensada, já que em Hallam Foe Dandelion Blow encontramos uma soberba canção essencialmente feita de tranquilidade melodista e teclados analógicos, antecipando o que parece poder ser o caminho de mais teclas e menos guitarras que estão a tomar rumo ao seu terceiro (e muito esperado álbum). O aperitivo dos Franz Ferdinand deixará satisfeito quem entrar no disco directamente pela faixa número 9. Mas há mais motivos para (re)descobertas numa compilação que, sem ser exactamente um best of da Domino, oferece um olhar representativo pelo catálogo da editora, sublinhando a sua política de opções editoriais que não só prima pela diversidade como por um irrepreensível sentido de bom gosto em função de cada caminho escutado. Não serão surpresa as colheitas feitas nos baús de bandas como os Clinic, Junior Boys, Sons & Daughters. Sabe sempre bem voltar a ouvir os Orange Juice. Juana Molina é sempre bem-vinda... Mas o grande protagonismo da selecção passa, curiosamente, por nomes menos expostos (sobretudo Psapp, U.N.P.O.L., Hood, Bill Wells Trio, Movietone). Da folk à pop electrónica, sons bem seleccionados de uma editora, que agora são elegante cenário de filme.
Vários
“Hallam Foe – Original Soundtrack”

Domino Records / Edel
3/5
Para ouvir: MySpace


Nos últimos anos a redescoberta da folk como genética capaz de estimular a criação de novas realidades tem-nos proposto um vasto espectro de linguagens, das mais próximas dos cânones clássicos a episódios de recontextualização de velhas referências em novas formas. É neste último extremo do espectro que podemos entender a estreia do projecto Thief, na verdade não mais que uma manifestação a solo de dois elementos do colectivo Jazzanova (Stefan Leisering e Alex Reinemer), aos quais aqui se junta a voz de Sascha Gottschalk. O autocolante na capa indicia o som que o disco guarda... indie-folk. Pois seja... Mas na verdade a ideia vai um pouco mais além... A folk, pelo melodismo acolhido, pela placidez sugerida (mesmo sob ocasional surto festivo), pela clara adopção de estruturas de canção, é o ponto de partida que levanta a curiosidade (a dos músicos, a nossa também). Depois, o savoir faire de quem lida com as novas electrónicas e ferramentas digitais e, ocasionalmente, o discreto tempero jazzy (que trazem de outras vivências que nos são já familiares), determinam pequenas viagens por terrenos que reconhecemos ser de descoberta e partilha, onde as cordas, as guitarras, os metais, são, mais que figurantes, preciosas colaborações. Sunchild (a faixa que dá título ao álbum) abre um alinhamento que revela uma colecção saborosa de canções que rapidamente se libertam de eventuais espartilhos de género (nomeadamente o ponto de partida folk) para viver momentos de prazer nos quais por regra se revela apenas o respeito à estrutura clássica da canção. De certa maneira, uma aventura comparável à que já este ano nos mostrou a Cinematic Orchestra, todavia conseguindo aqui um corpo de canções um tanto mais consistente que o que se escutava no também agradável Ma Fleur.
Thief
“Sunchild”

Sonar Kollektiv
3/5
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Naquela ténue linha que separa os limiares do caos dos indícios da ordem estão a acontecer algumas das mais entusiasmantes “invenções” pop/rock do momento. E um dos exemplos deste aparente registo de desnorte no limite escuta-se na obra em afirmação de um colectivo australiano de seis músicos que tem no nome uma referência finlandesa. Apesar de naturais de Melbourne, chamam-se Architecture In Helsinki e, depois do muito promissor In Case We Die, de há dois anos (e de um álbum de remisturas que se lhe seguiu em 2006), regressam com Places Like This e uma história recente de palcos que os colocou já lado a lado com bandas como os Clap Your Hands Say Yeah, Yo La Tengo ou Polyphonic Spree. As premissas são semelhantes às que estruturavam o álbum de 2005 e a alma baptismal dos Talking Heads continua a ser a mais evidente das fontes de inspiração. Mas contra o que antes nos mostravam, e parecendo assumir o disco de remisturas do ano passado como uma plataforma de transição, assumem hoje uma relação mais insistente com o ritmo e uma noção de desafio físico à dança. Relativamente curto (dez faixas em pouco mais de 31 minutos de duração), o álbum acaba contudo por mostrar que as transformações operadas entre o segundo e este terceiro álbum de originais não parecem em nada traduzir as expectativas de quem aguardava sucessão para a desafiante tempestade de boas ideias que morava no disco de 2005. O caos parece mais encenado que resultado de faísca fulminante, e a arquitectura rítmica insistente acaba por servir mais de espartilho que de pilar estrutural para outros patamares. Não faltam as boas canções, mas rapidamente se instala no ouvinte uma sugestão de inesperada monotonia que não ajuda. Undewater, a meio do alinhamento, é fresco mergulho por outras águas. Mas logo regressa o mesmo tom, que deixa pelas meias tintas uma proposta que antes brilhava, sobretudo, pela capacidade em nos sacudir e surpreender, sem a necessidade de convocar sovas de ritmo para o fazer.
Architecture In Helsinki
“Places Like This”
Cooperative Music / Edel
2/5
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O sucesso do álbum de 2004 Good News For People Who Love Bad News (e em particular a projecção além dos circuitos das college radios do single Float On) fez do quinto álbum dos norte-americanos Modest Mouse um dos mais aguardados pelas clientelas rock’n’roll de afinidade indie em 2007. A notícia do envolvimento directo do ex-Smiths Johnny Marr na composição (e, depois, na própria constituição oficial da banda), assegurava ainda mais expectativas... Os primeiros sinais do que poderíamos esperar de We Were Dead Before The Ship Even Sank chegaram-nos em Janeiro, com o cativante Dashboard, single-aperitivo que, na verdade, mais não era que a primeira canção nascida de uma primeira sessão de trabalho de Isaac Brock com Johnny Marr. O álbum, editado nos EUA em finais de Março (sim, e só agora chega “oficialmente” aos escaparates nacionais), não só foi confirmação dos apetites do mercado, como gerou uma série de críticas nas quais se reflectia igual entusiasmo. Porém, nada como o tempo para fazer a prova dos nove a um conjunto de canções que, meses depois, se revelou capaz de resistir à erosão que o passar dos dias vota à esmagadora maioria das edições discográficas. Estamos em mais um evidente laboratório onde se ensaiam exercícios de caos (mais ou menos) ordenado mas, mais que nuns Arcade Fire, sob muito evidentes marcas da genética Talking Heads. Apesar da presença de Marr, a personalidade de Brock (e dos Modest Mouse) mantém-se clara e inadulterada. Todavia, em algumas das canções revelam-se sinais de ainda visível sufoco sob desvario de electricidade e voz. Escute-se o potencialmente magnífico Florida, que acaba afogado. Mesmo assim, os piores inimigos de We Were Dead Before The Ship Even Sank não são estes solavancos de cacofonia rock’n’roll (que sucessivas audições suvizam), mas antes um longuíssimo alinhamento de 62 minutos de duração que tornam difícil a digestão de tanta informação.
Modest Mouse
“We Were Dead Before The Ship Even Sank”
Epic / Sony BMG
3/5
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A evidente exaustão do filão oportunista que por anda a viver da pilhagem de modelos colhidos no pós-punk não se manifesta apenas em medíocres segundos álbuns de bandas ainda recentemente feitas “fenómeno do mês” em primeiros discos francamente mais interessantes que os que nos deram nos últimos meses. Com efeito, não é preciso passar pelos segundos álbuns de grupos como os The Bravery, The Killers, Futureheads, Kaiser Chiefs ou Editors para ver que, depois de eventualmente interessante citação 80’s laroca, não há muito mais a esperar por essas bandas, tão igual que se tem revelado a repetição de fórmulas... Isto porque continuam a pingar nos escaparates das novidades exemplos nados-mortos de uma terceira vaga de bandas que, mesmo com o ocasional single curioso por perto, não mostram capacidade de sobreviver ao desafio de ter de gravar um álbum. Assim foi com os To My Boy, os KBC e, agora, os New Young Pony Club. Oriundos de Londres, erradamente conotados por alguns com o fogacho new rave (que não passará deste Natal), colhem referências na memória de discos de digníssimas bandas do pós-punk nova-iorquino como os B-52’s, Blondie e Talking Heads, procurando neles um sentido pop, apelo rítmico e garra rock’n’roll que lhes garanta atenção 30 anos depois... Nada errado até aqui, é certo. Na verdade deram nas vistas com o seu melhor: o minimalista e anguloso Ice Cream (onde se destacava o tom inexpressivo da voz de Tahita Bulmer), um dos melhores exemplos recentes de recontextualização de electrónica e viço pós-punk no presente. Agora, contudo, mostram em Fantastic Playroom que são meros aprendizes e que, depois de citar os mestres, não sabem bem o que mais dizer. O álbum satisfaz nas três primeiras canções (além de Ice Cream, Get Lucky e, sobretudo, o contagiante Hiding On The Starircase, delirante pastiche de Talking Heads). Depois, serve-se mais do mesmo. Anguloso, pop, dançável, certinho... Adorado hoje pelos seguidores da moda. Mas prontinho a ser esquecido na próxima saison...
New Young Pony Club
“Fantastic Playroom”
Modular / Universal
2/5
Para ouvir: MySpace


Também esta semana:
Anne Sofie Von Otter, Blue States, Elvis Presley (reedições), Kosheen, Frida Hyvönen, MIA, Lisa Germano (reedição)

Brevemente:
27 de Agosto: Pink Floyd (Piper At The Gates of Dawn – caixa), Super Furry Animals, Luke Vibert, VHS or Beta
3 de Setembro: Múm, Elvis Presley (reedições)
10 de Setembro: Animal Collective, Go! Team, Siouxsie Sioux, R Villalobos, Gravenhurst,
17 de Setembro: Murcof, Simon & Garfunkel (Live 1969). Manu Chao, Turin Brakes, David Bowie (reedição), Dead Or Alive (reedição), Debbie Harry

Setembro: Lambchop, Mazgani, PJ Harvey, Clã, Kanye West, Joe Henry, Broken Social Scene, Siouxsie, U2 (DVD), Hard Fi, Gorky’s Zygotic Mynci, Frank Black, Jona Lewie (reedição), Squeeze (reedições), Ian Brown, Pet Shop Boys (remisturas), Jose Gonzales, Iron & Wine
Outubro: David Fonseca, Robert Wyatt, Junior Boys, Devendra Banhart, Teddy Thompson, Sex Pistols (caixa de singles), Bob Dylan (best of), Thurston Moore
Datas retiradas de catálogos de editoras e lojas, contudo sujeitas a alterações