Um dos mais conhecidos autores de contos na literatura americana da primeira metade do século XX, Richard Connell (1893-1945) começou por trabalhar como jornalista, a escrita de ficção entrando em cena mais tarde na sua vida, dividida a partir de certa altura entre a publicação de ficção e a escrita de argumentos para cinema, tendo inclusivamente merecido uma nomeação para um Óscar em 1941, com Meet Joe Doe. Contudo, a sua mais visível contribuição para o cinema nasceu de um conto originalmente publicado na Variety em 1924, levado pela primeira vez ao plateau em 1932, alvo, depois, de outras adaptações e uma infinidade de citações. Trata-se, pois, de The Most Dangerous Game.
Zaroff (O Jogo Mais Perigoso) - no título da edição portuguesa - conta a história de um famoso autor de livros sobre caça que rumava ao Amazonas para mais uma aventura mas que, caído ao mar do iate no qual viajava, dá por si numa ilha desconhecida, na qual descobre uma única construção, imponente, na qual vive um antigo general russo, um criado cossaco e mais ninguém. O caçador vira presa ao descobrir que Zaroff, o excêntrico general, que vive para a arte da caça, dedica hoje o seu tempo a um jogo perigoso, o de caçar homens, que recolhe na ilha sempre que um navio naufraga nas suas imediações (o que é garantido por um sistema de sinalização enganosa criado para lançar embarcações sobre fatais rochedos).
O conto, curto, é um concentrado de acção e sugestões, usando técnicas narrativas de grande poder visual que revelam uma identidade cinematográfica que se reconhece em alguma escrita da época. Sem desviar nunca as palavras da apresentação de personagens, lugares e acção, a escrita é pura contenção na forma e absoluto concentrado de imagens, situações, acções. Cinema escrito, numa das mais brilhantes manifestações de um género que, na alvorada do século XX, se tornou presa inevitável para os caçadores de argumentos.
Richard Connell, cuja obra conheceria em Alfred Hitchcock um dos seus maiores divulgadores, viu este conto transformado em filme pela primeira vez em 1932 por Irving Pinchel e Ernest B Shoedsack, numa adaptação com condimentação ao gosto de Hollywood, nomeadamente a introdução de perigos vários sobre uma frágil figura feminina. Em 1943 o conto conheceu adaptação para rádio por Orson Welles e, dois anos depois, segunda vida no cinema por Robert Wise (como The Game Of Death). A história inspirou muitas outras adaptações ou citações, do vilão Scaramanga de O Homem Com A Pistola Dourada (1974) ao episódio The Squire Of Gothos, da série original Star Trek (1967). E, claro, supostamente o assassino do Zodíaco...