segunda-feira, maio 07, 2007

Discos da semana, 7 de Maio

Alguns discos que estão a chegar aos escaparates, num breve olhar crítico.

A expectativa era inevitável. Com estatuto de "estrela" depois de Dancer In The Dark, com inquieto perfil de "bizarra" entretanto sublinhado pelas opções artísticas mais recentes (de Medúlla à colaboração em Drawing Restraint 9), a islandesa divide hoje opiniões como poucos no universo da música pop de costela mais alternativa. Volta reconcilia-a com os instrumentos, com a canção, com regras formais que já visitou em discos anteriores. Mas, como sempre, está longe de ser um disco unânime. Apesar das já conhecidas marcas de personalidade (sobretudo certos maneirismos vocais), Björk compreendeu que a necessidade de mudança na sua música passava pelo desafio a novos colaboradores. E, de facto, não faltam. Do cada vez mais aclamado de Timbaland a Antony (com quem partilha dois duetos, um deles, The Dull Flame of Desire, representando “o” momento do álbum), da chinesa Min Xiao-Ben ao malinense Toumani Diabaté, as presenças reflectem desejos de novos horizontes, importando para a sua música marcas de outras paragens sonoras e geográficas. Repetente, o velho parceiro Marc Bell assegura uma inabalável relação com as electrónicas. Björk já descreveu o som de Volta como "techno voodoo" e usa frequentemente expressões como "pagão", "tribal" e "extrovertido" para descrever um álbum onde uma música digital do século XXI se cruza com laivos de jazz, música chinesa e percussões africanas. Menos volátil que Medúlla, o álbum revela reflexões sobre política (concretamente fala de bombistas suicidas), o mundo e as viagens, a fé. E dedica particular atenção à maternidade, ora comentando, em jeito de acto de contrição, eventuais erros na educação do filho mais velho, ora projectando no futuro a linha de vida que imagina para a mais nova. Apresentando ao som de Earth Intruders, o álbum teve por cartão de visita um single que cativou os descontentes dos últimos ensaios, assinalando um reencontro com a eficácia pop dos dias de Post, com o novo apelo tribal a sublinhar a diferença e novidade. O disco mantém depois viva essa dupla personalidade, entre a citação do passado e a procura de novos desafios, da libertinagem noise de Declare Independence às paisagens texturalmente mais delicadas de I See Who You Are. Volta é um disco de ousadia e risco, mas de mais vontades que concretizações, de mais ideias que canções. O melhor é servido pelos colaboradores, sublinhando-se assim uma cada vez mais evidente exaustão de maneirismos vocais esgotados que desviam as atenções para as filigranas de novidade que escondem. Ao ouvirmos Antony a cantar, não temos dúvida de que, em Björk ainda mora uma grande criadora.
Björk
“Volta”
One Little Indian / Universal
3/5
Para ouvir: MySpace

Um dos mais versáteis colectivos dos nossos tempos, a Cinematic Orchestra nasceu como uma das mais claramente “jazzísticas” das propostas da Ninja Tune nos anos 90, tendo a sua carreira entretanto demonstrado que são mais que um caso para arrumar numa prateleira de género e ponto final. As raízes punk de Jason Swinscoe (que, antes de comandar os destinos da Cinematic Orchestra, vestia a camisola dos Crabladder, híbrido de jazz, punk e os mais temperos que encontrassem à mão de semear), têm-lhe permitido um percurso evolutivo em permanente estado de saudável inquietude, a noção de desafio morando a cada novo álbum, não só para os músicos, mas também para os que os acompanham enquanto espectadores. Os seus primeiros dois álbuns (Motion, de 1999, e Everyday, de 2002) foram espaço de ensaio de uma linguagem tranquila que, entretanto, experimentou o cinema (ao dar som alternativo ao clássico O Homem Com a Câmara de Filmar, de Dziga Vertov, em 2003). Quatro anos depois, Ma Fleur é talvez a mais ousada das aventuras do colectivo (face aos princípios com que se afirmou, entenda-se). A puslão jazzística, a identidade de colectivo, estão ainda evidentes, mas é na exploração da canção, do piano e de novas referências que se afirma a identidade de um novo disco que, ostensivamente, apresentaram com o single To Build A Home, melancolia para voz (a de Patrick Watson), desencanto e piano como se lembra dos primeiros tempos de um Maximilian Hecker. Na verdade, a escuta e retorno a Ma Fleur acabam por revelar mais familiaridade com o passado da própria Cinematic Orchestra que o que as primeiras impressões, com o single, possam ter sugerido. Esta música herda os “apetites” cinematográficos presentes nos discos anteriores, acentua um carácter, ora ilustrativo, ora narrativo. E, como nos bons filmes, agarra-nos até à última cena.
The Cinematic Orchestra
“Ma Fleur”
Ninja Tune / Symbiose
3/5
Para ouvir: Site oficial


Ele era a alma dos Galaxie 500, cujas heranças transportou para os Luna onde, por sua vez, a “encontrou”. Desactivados ambos os projectos (os Luna com um soberbo “best of” em 2006, editado com um CD extra de raridades, lados B e versões a justificar qualquer corrida a uma loja de discos), Dean Wareham e Britta Phillips estrearam-se em 2003 no espantoso L’Aventura (no qual não só encontrávamos uma das canções da década, ou seja, Night Nurse, como uma versão de I Deserve It, de Madonna e uma outra, de Indian Summer, dos Doors). Quatro anos depois, a sequela não mostra vontade de fugir ao que nos habituaram, inclusivamente, melhora a ideia. Canções de absoluta paz (a tensão e a dor, quando existem, moram nas palavras e nas histórias que nos sugerem), temperadas a delicadas linhas para guitarra, texturas para teclados (cortesia de Sonic Boom) a servir de colchão. Estilo e sedução, com ecos de elegância ou decadência chique segundo os velhos livros de estilo de 60 e cada vez mais presente protagonismo partilhado entre as vozes de Dean e Britta. Cantam Lee Hazlewood, seguindo um velho gosto por versões reinventam os Troggs, Donovan, e, na hora de mostrar produção própria, revelam não só melhor escrita, como impressionante capacidade assimilação destas mesmas pistas em novas canções que não escondem o prazer de uma maquilhagem retro, mas sem as habituais facilidades da nostalgia. A eloquente produção de Toni Visconti garante ao disco uma arte final de puro requinte pop. Um disco para quem gosta de pop gourmet, facção “já com idade para ter juízo”.
Dean & Britta
“Back Numbers”

Rounder
4/5
Para ouvir: MySpace


Filhas de Brighton (à beira-mar, daí talvez a capa de fresca maresia que acompanha o novo disco), as Electrelane têm construído uma interessante carreira que, mesmo pontualmente tendo cruzado as atenções dos fazedores de opinião “brit”, nunca entrou em grandes ondas do momento. Pelo contrário, ainda hoje mostram sinais de atenção por modelos e referências pelos quais construíram a soma das suas personalidades, nomeadamente memórias do krautrock e o som de velhos teclados analógicos, que cruzam com um rock e uma atitude que não esconde um gosto pelas heranças dos Velvet Underground, das escolas indie americanas de finais de 80 e pela pontual erupção pop... alternativa. Verdadeiro sucessor de The Power Out (de 2004), retomando as vozes, ausentes no intermediário Axes, o novo álbum mostra sinais de sonhos de grandiosidade épica nas formas, mais teatrais que nunca, sem que tal tenha implicado um desistir das (grandes) imperfeições técnicas e rugosidades emotivas que sempre as caracterizaram. Ainda em busca do seu eventual disco de referência, as Electrelane conseguem aqui um dos mais consistentes dos seus esforços até ao momento. A escrita das canções ainda é irrugular (vai do melhor ao nem por isso), e por vezes é ainda nos surtos de entusiasmo instrumental (como no contagiante Tram 21) que dão vontade de por elas lançar foguetes. Porém, nos seus altos e baixos, No Shouts No Calls é um seguro passo para um quarteto que, mesmo sem ter ainda aprendido a tocar os seus instrumentos, tem mais vontade de criar uma música de verdade que muitos virtuosos desinspirados que por aí somam êxitos.
Electrelane
“No Shouts No Calls”

Too Pure / Popstock
3/5
Para ouvir: MySpace

As melhores escolas de finais de 60 continuam a ser pasto para novas ideias. E um dos mais sérios exemplos da vitalidade dessas memórias encontra-se no álbum que nos apresenta David Vandervelde, músico de Chicago que, com a ajuda do parceiro Jay Bennett (dos Wilco) nos apresenta em The Moonstation House Band um das mais intrigantes primeiras obras que a pop já escutou em 2007. Nas suas prateleiras (ou, melhor, no iPod, adivinhamos a presença, em destaque, de clásscos como Magical Mistery Tour dos Beatles, Forever Changes dos Love, Their Satanic Majesties Request dos Rolling Stones e Hunky Dory de Bowie, canções soltas dos Faces, Kinks, Mamas & The Papas... Mas, na hora de se “ouvir” ao espelho, quem ali vê não é mais que Marc Bolan. Os maneirismos vocais, o próprio timbre, lembram incrivelmente os dias pré-eléctricos do feiticeiro pop que fez com que T-Rex não fosse só nome de dinossáurio, bem como as suas mais melodistas baladas da fase glam. A idade de Vandervelde é, aqui, a supresa maior de um álbum cuja datação no presente se garante apenas pelo requinte da produção num estúdio actual, todas as canções demonstrando sinais claros de pistas colhidas num passado em que os pais do músico certamente ainda nem se conheciam... Com 22 anos, David, formado ao serviço do estúdio de Jay Bennett, já trabalhou com Mark Eitzel e Jonathan Rice. E, na hora de criar a sua música, mostra como as fronteiras de geração podem ser apenas artificial barreira levantada pelos media tradicionais (leia-se sobretudo a rádio e televisão), na hora de pensar que música se dá a ouvir aos mais jovens... No caso de David, o gosto fez-se com álbuns de 1965 a 1970... E, pelo que se ouve no disco, não se deu nada mal.
David Vandervelde
“The Moonstation House Band”
Secretly Canadian / Flur
4/5
Para ouvir: MySpace


Também esta semana:
Manic Street Preachers, Groove Armada, Elliott Smith, Yoko Ono (remisturas), Travis, Lavender Diamond, The Fall (3 reedições), Gary Numan (BBC Sessions)

Brevemente:
14 de Maio: Rufus Wainwright, OMD (reedição), Wilco, Larrikin Love, The 1990’s, Pere Ubu (reedição), Tears For Fears (best of)
21 de Maio: Blonde Redhead, Tiga (remisturas), The Knife (ed DeLuxe), Pet Shop Boys (DVD), Hot Chip (DJ Kicks), The National, Depeche Mode (reedições), Von Sudenford, Moody Blues (BBC Sessions 1967-70), Lena D’Água
28 de Maio: Black Rebel Motorcycle Club (ed nacional), Clash (caixa), Jeff Buckley, Richard Thompson

Maio: Four Tet, Larrikin Love
Junho: Spiritualized, Bonde do Role, Bryan Ferry (DVD), The Bravery, Marilyn Manson, Jorge Palma, Paul McCartney, David Bowie (DVD), Amina
Julho: Stax: 50 Anos (caixa), Travelling Wilburys (reedição), Blondie (reedição)


Estas datas podem ser alteradas a todo o momento