No nosso imaginário televisivo (e na sua patética falta de imaginação), os dramas familiares tendem a ser concebidos em função de uma única matriz: a da telenovela. Aí vogamos entre dois limites: as personagens são derivações de clichés ancestrais (a mulher “abandonada”, o marido “traidor”, o filho “esquecido”, etc.) ou, então, estão condenadas a funcionar como bandeiras de comportamentos sociais ou sexuais (numa telenovela, é-se homossexual do mesmo modo que se pertence a um partido político...).
Daí o destaque que merece a série americana Irmãos e Irmãs que está a passar na RTP 2 (sexta-feira, 22h40), até porque possui um elenco de gente muito talentosa. Criada por Jon Robin Baitz, trata-se de uma teia familiar que se adensa e agrava a partir da morte do pai (Tom Skerritt). Curiosamente, o efeito do seu desaparecimento não se mede apenas em termos afectivos, já que ele deixa uma herança problemática na gestão da empresa familiar.
A personagem da mãe (Sally Field) é tanto mais interessante quanto nela se cruza o modelo clássico da matriarca americana com os sinais de um presente rasgado por novas componentes dramáticas: repare-se, em particular, na sua relação com um dos filhos (Dave Annable), exibindo os traumas próximos da missão que cumpriu no Iraque. Aliás, Irmãos e Irmãs remete-nos, a quente, para a actualidade, tanto mais que a actividade profissional de uma das filhas (Calista Flockhart) passa pela televisão e pela abordagem da América de George Bush.
Apesar de todas estas componentes e da presença de uma grande vedeta televisiva como é Calista Flockhart (protagonista de Ally McBeal), a RTP não se comoveu com o produto que adquiriu, programando-o discretamente (nos EUA, a ABC, canal popular e generalista, difunde Irmãos e Irmãs às 10 da noite). Em todo o caso, registe-se que já não temos que dizer que a série passa nessa aberração nominativa que era “a 2”. Nada disso: regressou a “RTP 2”, aliás com agressiva campanha de cartazes de rua. Estranho Portugal televisivo em que vivemos: há pouquíssimos anos, gastou-se imenso para proclamar o novo-riquismo iconográfico da “2”; agora, volta a investir-se para anunciar o regresso da... RTP 2. Quantas horas de ficção teriam sido produzidas com o dinheiro gasto?
* Texto publicado no no Diário de Notícias (1 de Abril), com o título 'Dramas de família'.
Daí o destaque que merece a série americana Irmãos e Irmãs que está a passar na RTP 2 (sexta-feira, 22h40), até porque possui um elenco de gente muito talentosa. Criada por Jon Robin Baitz, trata-se de uma teia familiar que se adensa e agrava a partir da morte do pai (Tom Skerritt). Curiosamente, o efeito do seu desaparecimento não se mede apenas em termos afectivos, já que ele deixa uma herança problemática na gestão da empresa familiar.
A personagem da mãe (Sally Field) é tanto mais interessante quanto nela se cruza o modelo clássico da matriarca americana com os sinais de um presente rasgado por novas componentes dramáticas: repare-se, em particular, na sua relação com um dos filhos (Dave Annable), exibindo os traumas próximos da missão que cumpriu no Iraque. Aliás, Irmãos e Irmãs remete-nos, a quente, para a actualidade, tanto mais que a actividade profissional de uma das filhas (Calista Flockhart) passa pela televisão e pela abordagem da América de George Bush.
Apesar de todas estas componentes e da presença de uma grande vedeta televisiva como é Calista Flockhart (protagonista de Ally McBeal), a RTP não se comoveu com o produto que adquiriu, programando-o discretamente (nos EUA, a ABC, canal popular e generalista, difunde Irmãos e Irmãs às 10 da noite). Em todo o caso, registe-se que já não temos que dizer que a série passa nessa aberração nominativa que era “a 2”. Nada disso: regressou a “RTP 2”, aliás com agressiva campanha de cartazes de rua. Estranho Portugal televisivo em que vivemos: há pouquíssimos anos, gastou-se imenso para proclamar o novo-riquismo iconográfico da “2”; agora, volta a investir-se para anunciar o regresso da... RTP 2. Quantas horas de ficção teriam sido produzidas com o dinheiro gasto?
* Texto publicado no no Diário de Notícias (1 de Abril), com o título 'Dramas de família'.