[ 17 Julho 2018 ] |
1. Como lidar com as notícias sobre Donald Trump? Ou melhor: que desafios jornalísticos Trump coloca?
2. Impossível generalizar, como é óbvio. Digamos apenas que os ziguezagues (anti-)democráticos do Presidente dos EUA impõem aos jornalistas uma consciência muito aguda do seu poder real enquanto líder político, da realidade do seu poder. Creio que importa, sobretudo, resistir a transformá-lo numa caricatura condenada a um processo de auto-destruição (opção que muitos meios de comunicação adoptaram durante a sua campanha eleitoral). Nas suas óbvias e reveladoras diferenças, estas primeiras páginas de dois jornais franceses são sintomáticas desse problema (sem que, evidentemente, se pretenda reduzir o conteúdo plural — e muito rico — de cada uma das publicações ao que aqui vemos).
3. O Libération opta por uma estratégia simplista de ridicularização de Trump, parecendo até ignorar que, se é verdade que a classificação de troll (proveniente da mitologia escandinava) se generalizou como designação de uma personagem entre o estúpido e o incómodo, não é menos verdade que se aplica também a figurinhas tão bizarras quanto carinhosas do imaginário infantil. Por sua vez, no Le Monde encontramos a frieza de uma descrição que convoca os factos para propor, sem equívocos, uma leitura política das respectivas incidências — em vez de ser um "troll" que pode suscitar uma gargalhada de condenação, Trump surge como o "melhor aliado de Vladimir Putin".
4. Mesmo que isso incomode a "objectividade" televisiva que domina muitos cenários da paisagem mediática, fazer notícias não é, nunca foi, "reproduzir" o que quer que seja — fazer notícias é sustentar uma visão do mundo, ao mesmo tempo perguntando que lugar ocupamos, ou podemos ocupar, nas suas dinâmicas.
5. Mais concretamente: fazer notícias não é o mesmo que aplicar a lógica de espectáculo, entre a irrisão e o panfleto, que encontramos em alguns talk shows. Ainda assim, paradoxalmente, por vezes é nos talk shows que deparamos com uma conjugação de inteligência e subtileza capaz de contrariar e, implicitamente, criticar os formatos mais banais do jornalismo. Eis um excelente exemplo que aqui se regista, também a propósito da cimeira Trump/Putin em Helsínquia: são os comentários de Stephen Colbert em The Late Show.