quarta-feira, julho 18, 2018

Trump: questões de linguagem

ED WEXLER
Cartoons em The Washington Post
Subitamente, Donald Trump dá o dito por não dito, dizendo agora que foi erradamente interpretado quando considerou — contra as investigações a decorrer no seu próprio país — que Vladimir Putin estava ilibado de qualquer suspeita sobre alguma intervenção nas eleições presidenciais americanas de 2016. Argumenta mesmo que foi mesmo um ligeiro erro de "uma" palavra [video, New York Times].
Chegámos, assim, a uma prática festiva de intermitente fake language: já não importa o que se diz, porque aquilo que se difunde é tão só a ideia obscena segundo a qual o que foi dito antes não era o que devia ter sido dito — e por aí fora, num canibalismo infinito da linguagem pela linguagem.
Vivemos, assim, marcados por um ensimesmamento incestuoso do real. Na idade da comunicação global, já não há, afinal, desejo de comunicação: apenas a vertigem de consumirmos ilusões que se alimentam da sua interminável multiplicação — por alguma razão, a agitação "social" das redes se confunde com um mercado a gerar sempre novos labirintos de coisa nenhuma. Trump é a encarnação exemplar desse dispositivo que ocupou o nosso tempo.