Na sequência da atribuição do Nobel da Literatura a Kazuo Ishiguro, um vento de surpresa, aqui e ali tingido de indignação, varreu muitos sectores do jornalismo planetário — afinal, o premiado não estava na lista...
Ah, a lista! A famosa lista! Todos os anos, em todos os recantos do mundo, há jornalistas (?) que constroem especulações mais ou menos anedóticas, não poucas vezes em tom autoritário, sobre quem vai ganhar (o que, para eles, é o mesmo que quem "devia" ganhar) o Nobel da Literatura. Como? Porque... eles sabem que há uma lista! Nunca a mostram, nem sequer conseguem apresentar qualquer indício da sua material existência. O certo é que se entregam a essa suprema e disparatada arte da "antecipação", como se informar fosse, não tratar o que acontece, mas construir oráculos dedicados a revelar o que vai acontecer...
Provavelmente, na maioria dos casos, essas mesmas intervenções jornalísticas até se congratularam com o reconhecimento de Ishiguro. Mas, repare-se, não é isso que está em causa — é, isso sim, um modelo de (des)informação que acredita, ou quer fazer acreditar, que possui a chave mágica para dar conta dos mecanismos de funcionamento de tudo e mais alguma coisa, desde os incidentes que podem preceder um golo num jogo de futebol até às reuniões absolutamente fechadas e secretas da Academia Sueca.
Em qualquer caso, registe-se a lamentável ocorrência: em muitos casos de intervenção informativa, a notícia sobre Ishiguro ficou-se por um exercício pueril de ilusionismo jornalístico, dispensando o essencial. Que essencial? As qualidades do homem que, por acaso, até é escritor, mas que deve pagar pelo pecado de quem não estava na lista...
>>> Palavras de Sara Danius, secretária permanente da Academia Sueca, sobre Kazuo Ishiguro.
>>> Palavras de Sara Danius, secretária permanente da Academia Sueca, sobre Kazuo Ishiguro.