quinta-feira, agosto 03, 2017

Grande romance, pequeno filme

Mark Rendall e Gemma Arterton
— A HISTÓRIA DO AMOR
O romance A História do Amor, de Nicole Krauss, deu origem a um filme que não faz justiça à sua complexidade — este texto foi publicado no Diário de Notícias (27 Julho).

É bem verdade que os filmes não valem mais nem menos em função da data em que são lançados. Seja como for, isso não nos impede de reconhecer que há épocas do calendário cinematográfico que condicionam, e muito, a percepção dos filmes e, no limite, a sua performance comercial. O Verão, por exemplo. Com a distribuição/exibição submetida à agressividade promocional dos “blockbusters”, proliferam os pequenos filmes que, por uma ou outra razão, foram sendo menorizados pela indústria e secundarizados pelos mercados — a época estival surge como a sua derradeira e, afinal, impossível oportunidade.
A História do Amor é um desses filmes. Objecto esforçado e menor, sem dúvida. Os resultados são mesmo algo frustrantes face às potencialidades do material de base, isto é, o romance homónimo da americana Nicole Krauss (lançado em 2005, distinguido com o Prémio Internacional William Saroyan). Em todo o caso, há nele uma simpática aposta na recuperação do melodrama histórico, tendo por pano de fundo a Segunda Guerra Mundial, emprestando-lhe, pelo menos, a nostalgia de quem tenta reactivar o fulgor dos clássicos das décadas de 1940/50.
O romance de Krauss constituía um desafio imenso. Desde logo, porque não se trata de uma típica história de “reconstituição” da guerra: há, aqui, um ziguezague temporal e dramático entre as personagens de alguns judeus polacos, em 1940, perseguidos pelos nazis, e os ecos das suas vivências no ano de 2005, em Nova Iorque. Depois, porque os acontecimentos narrados envolvem uma peculiar componente afectiva: A História do Amor é também o título de um romance dentro do romance (e também, claro, dentro do filme), escrito e perdido pela personagem nuclear de Léo Gursky, ainda na Polónia, e que ele não desiste de encontrar...
Infelizmente, Radu Mihaileanu, realizador francês de origem romena (autor de O Concerto e A Fonte das Mulheres), não terá visto nas nuances da escrita de Krauss a sua prioridade. Se algumas cenas conseguem evocar as subtilezas emocionais do livro, na maior parte das situações Mihaileanu prefere um estilo tão esquemático quanto pomposo, quase sempre apoiado pela música redundante de Armand Amar.
Na personagem do velho Gursky, o veterano inglês Derek Jacobi mostra as suas qualidades, contracenando, em particular, com outro veterano, o americano Elliott Gould, nos últimos anos quase reduzido a uma banal carreira televisiva. Na figura central de Alma, a jovem para quem Gursky escreveu o seu romance, Gemma Arterton nunca consegue aproximar-se dos modelos clássicos que tenta reavivar. Enfim, para além dos desequilíbrios do mercado, é sempre inútil especular sobre os filmes que nunca se fizeram... ainda assim, ficamos a pensar no espantoso filme que se podia ter feito a partir do romance de Krauss.