segunda-feira, setembro 12, 2016

"The Night of" — um balanço e uma pergunta

Riz Ahmed / THE NIGHT OF
The Night of, a série de Richard Price e Steve Zaillian, ajuda-nos a (re)pensar a actualidade televisiva e as suas relações com o cinema — esta crónica foi publicada no Diário de Notícias (9 Setembro), com o título 'Sob o signo do cinema'.

1. Porque é que The Night Of (TV Séries) vai ficar, sem qualquer sombra de dúvida, como um dos acontecimentos fulcrais do ano de 2016? Porque a série concebida por Richard Price e Steve Zaillian prova que a regra televisiva — aceleração gratuita + formatação psicológica + menosprezo pela inteligência do espectador — ainda tem, pode continuar a ter, excepções. Mais do que isso: a sua inventiva filiação em todo um imaginário cinéfilo do filme “noir” mostra que é possível manter uma relação com o cinema que não seja banalmente pitoresca ou instrumental.

2. Ao longo dos últimos dois ou três anos, em alguns canais de cabo, a multiplicação da oferta de filmes inéditos nas salas de cinema, ou nos circuitos de DVD, é sintomática da crise de modelos que o audiovisual atravessa. Não que a apresentação de tais filmes seja condenável — bem pelo contrário. De qualquer modo, está por demonstrar que o sistema televisivo possua um pensamento sólido para valorizar os seus próprios produtos. A saber: trata-se apenas de preencher espaços de programação ou existe uma política cultural (leia-se: comercial) de criação de novos públicos?

3. Vale a pena arriscar pensar através do labirinto da globalização. E celebrar as suas evidências menos citadas. Assim, quando olhamos para modelos de sucesso como o canal franco-alemão Arte ou a HBO, nos EUA, não é preciso grande esforço para compreender que todas as suas matrizes de programação estão, directa ou indirectamente, material ou simbolicamente, marcadas por um elaborado gosto cinéfilo. Tal opção não decorre de qualquer caução crítica, muito menos teórica. Resulta antes da consciência de que o cinema, com mais ou menos derivações digitais ou futuristas, constitui um elemento fulcral do imaginário colectivo. Que é como quem diz: do consumo audiovisual.