sexta-feira, fevereiro 05, 2016

O "western" revisto por Tarantino


O "western" outra vez? Sim, mas com a marca transfiguradora de Quentin Tarantino — este texto foi publicado no Diário de Notícias (4 Fevereiro), com o título 'O teatro segundo Tarantino'.

De facto, The Hateful Eight não são Os Oito Odiados. O título original era, obviamente, ingrato para qualquer tradução, quanto mais não seja porque não parece possível preservar a rima sonora do inglês. Em qualquer caso, as oito personagens de Tarantino são seres “odiosos” e “detestáveis” — não há sequer quem os possa odiar porque, em boa verdade, quase não existem outras personagens. Isto para dizer que, retomando as obsessões que vêm da sua primeira longa-metragem (Cães Danados, 1992), Tarantino nos oferece uma admirável arquitectura narrativa em tudo e por tudo visceralmente teatral: primeiro, porque o espaço é tão fechado quanto claustrofóbico; depois, porque a matéria primeira de todas as trocas, cumplicidades e traições é a palavra. Em cena está um confronto tenso, potencialmente sangrento, em paisagens clássicas do “western”, pontuadas pela partitura de Ennio Morricone — Tarantino consegue, finalmente, trabalhar com o seu compositor de eleição, recuperando a energia trágica dos “westerns” (de Sergio Leone) que ele musicou.