sexta-feira, janeiro 22, 2016

A criação segundo Keith Jarrett

FOTO: Rose Anne Colavito / ECM
Há quem considere que o mal estar que, por vezes, acompanha as performances públicas de Keith Jarrett (n. 1945), levando-o a protestar contra os espectadores que não conseguem respeitar o silêncio exigido, ou mesmo a abandonar o palco, justificaria que o pianista tomasse aquela que foi a opção final de Glenn Gould. A saber: desistir dos concertos e investir todas as suas energias no trabalho de gravação no recato do estúdio.
Podemos admitir que tal hipótese já foi considerada pelo próprio. Mas obviamente não assumida. O seu álbum Creation, lançado pela ECM a 8 de Maio de 2015 (data do 70º aniversário de Jarrett), é a demonstração eloquente de um desejo de improvisação que, em última instância, procura a vulnerabilidade inerente à exposição em palco e ao seu singular impulso criativo (é disso que o título fala).
Antologiando nove partes de seis concertos de 2014, realizados em quatro cidades (Tóquio, Toronto, Paris e Roma), Creation é uma colecção de momentos de indizível confessionalismo, de alguma maneira procurando um lugar entre a herança de compositores que já gravou (Bach, sem dúvida, talvez Shostakovich) e a deriva jazzística [em baixo, alguns extractos colocados online pela Universal Music France].
Dir-se-ia que Jarrett não desiste da verdade muito física do toque das teclas, desse modo arriscando viver a sua radical solidão numa partilha relutante com os incautos espectadores — enquanto nos doar discos como este, todos os seus pecados lhe serão perdoados.