domingo, outubro 11, 2015

O tempo televisivo [citação]

>>> (...) o tempo é um género extremamente raro na televisão. E se se empregam minutos tão preciosos para dizer coisas tão fúteis, é porque essas coisas tão fúteis são de facto muito importantes na medida em que escondem coisas preciosas. Se insisto neste ponto é porque sabemos, por outro lado, que há uma proporção muito importante de pessoas que não lêem jornais diários, que se dedicam de corpo e alma à televisão como sua única fonte de informações. A televisão tem uma espécie de monopólio de facto sobre a formação dos cérebros de uma parte muito importante da população. Ora, pondo a tónica nos casos do dia, preenchendo o tempo raro com vazio, com nada ou quase-nada, afastam-se as informações pertinentes que o cidadão deveria possuir para poder exercer os seus direitos democráticos. Por esta via, traça-se uma divisão, em matéria informativa, entre os que podem ler os diários chamados sérios, se é que estes continuam a ser sérios perante a concorrência da televisão, os que têm acesso aos jornais internacionais, às emissoras radiofónicas em línguas estrangeiras e, por outro lado, os que têm por única bagagem política a informação fornecida pela televisão, quer dizer aproximadamente nada.

PIERRE BOURDIEU
Celta Editora, Oeiras, 1997