sábado, junho 13, 2015

A Guerra Fria revista por Steven Spielberg

E regressamos ao trailer do novo Spielberg: Bridge of Spies vai ser, seguramente, um título forte do final do ano — este texto foi publicado no Diário de Notícias (11 Junho).

De que falamos quando falamos do trailer de um filme de Steven Spielberg? Por certo de algo em que o nome do autor pode ser tão (ou mais) importante que a identificação dos actores. Assim acontece com a sua nova realização, Bridge of Spies: começa por se ouvir uma voz que diz a alguém que “foi seleccionado para uma missão que não tem autorização para discutir com ninguém fora desta sala”; a voz acrescenta que se está a travar uma “guerra de informação” com a União Soviética e, ao 25º segundo, as primeiras letras no ecrã dizem “um filme de Steven Spielberg”.


Um pouco à maneira do que aconteceu com Alfred Hitchcock nas décadas de 1950/60, Spielberg é alguém cuja chancela constitui o primeiro trunfo promocional dos seus filmes. Neste caso, tanto mais quanto Bridge of Spies parece poder inscrever-se no conjunto de narrativas com que o autor de grandes espectáculos populares como Os Salteadores da Arca Perdida (1981) ou Parque Jurássico (1993) tem também revisto e reavaliado alguns momentos emblemáticos da história dos EUA.
As informações disponíveis permitem-nos situar Bridge of Spies na categoria temática a que pertencem, por exemplo, Amistad (1997), sobre a escravatura, ou O Resgate do Soldado Ryan (1998), evocando o desembarque dos Aliados na Normandia. Trata-se, agora, de contar a história verídica do advogado James B. Donovan, mobilizado pelo governo americano para, no ano de 1961, em plena Guerra Fria, negociar a libertação do piloto Francis Gary Powers, capturado pelos soviéticos depois de terem abatido o seu avião.
O trailer sugere uma ambiência de thriller de espionagem. A sua personagem central — não o piloto, mas o advogado, interpretado por Tom Hanks — surge como um típico herói clássico, tentando encontrar a grandeza que lhe permita cumprir a sua espinhosa emissão. A primeira vez que o vimos é mesmo para o ouvir formular a sua perplexidade face à missão que lhe querem entregar: “Sou um advogado que trata de seguros...”
Encenando um momento de grande tensão política e militar (algumas imagens evocam a construção do Muro de Berlim), Bridge of Spies deixa, para já, uma curiosa interrogação: será que Spielberg está à procura de (re)encontrar a lógica de fábula nacional cujas raízes estão, por exemplo, em alguns filmes lendários de Frank Capra, rodados nos anos 30/40? Uma coisa é certa: Tom Hanks é o herdeiro muito directo da aura mitológica de alguns actores emblemáticos de Capra, nomeadamente Gary Cooper e James Stewart.
Entretanto, a escolha do dia 16 de Outubro para a estreia americana de Bridge of Spies (ainda sem data portuguesa anunciada) significa que este é um título empenhado em discutir uma posição de evidência da próxima temporada de prémios. Curiosidade a ter em conta: devido a problemas de saúde de John Williams, desta vez Spielberg contou com Thomas Newman como compositor da banda sonora original.