Variações de Casanova, com John Malkovich sob a direcção de Michael Sturminger, leva-nos a evocar uma série de referências mais ou menos distantes, com inevitável destaque para o Casanova (1976), de Federico Fellini, com Donald Sutherland — este texto foi publicado no Diário de Notícias (2 Dezembro), com o título'História, mitologia e solidão de Giacomo Casanova'.
Quando pensamos nas representações de Giacomo Casanova em cinema, o filme de Federico Fellini com Donald Sutherland emerge como uma espécie de padrão absoluto. Na sua pessoalíssima visão, o Casanova de Fellini — cujo título original é mesmo Il Casanova di Federico Fellini — surgiu também como consagração de um modelo de grande produção de que o realizador italiano era, na altura, a mais emblemática referência europeia.
Fellini tinha assinado dois filmes eminentemente pessoais, Roma e Amarcord, respectivamente em 1972 e 1973. Com distribuição internacional assegurada por um grande estúdio de Hollywood (Universal), o novo Casanova, lançado em 1976, parecia reunir o melhor de dois mundos: uma referência literária europeia (História da Minha Vida, de Giacomo Casanova) e um muito popular actor americano (nascido no Canadá) que nos últimos anos coleccionara sucessos como MASH (1970), Klute (1971) e Aquele Inverno em Veneza (1973). Não dominando a língua italiana, Sutherland reconheceu que nunca percebeu muito bem o que Fellini procurava; o certo é que o filme ficou como uma das mais subtis abordagens de Casanova, algures entre a história e a mitologia, expondo a solidão radical da personagem.
Encontramos Casanova em títulos desde os tempos heróicos do mudo. Há mesmo uma célebre produção francesa de 1927, Casanova, o Galante Aventureiro, dirigida por Alexandre Volkoff, protagonizada pelo lendário actor russo Ivan Mosjoukine.

Ainda assim, alguns dos projectos mais interessantes em torno de Casanova resultaram da vontade de o devolver ao seu contexto histórico, contrariando a imagem estereotipada do “grande conquistador”. Assim aconteceu com A Iniciação Sexual de Casanova (1969), de Luigi Comencini: o jovem inglês Leonard Whiting era o protagonista, um ano depois de ter participado no Romeu e Julieta, de Franco Zeffirelli. Em 1982, em A Noite de Varennes, Ettore Scola abordava as convulsões da Revolução Francesa a partir de um grupo de passageiros numa carruagem, um deles Casanova, interpretado por Marcello Mastroianni.
Casos como O Regresso de Casanova (1992), com Alain Delon, ou a série televisiva Casanova (2005), com Peter O’Toole a assumir a velhice da personagem (interpretado, em novo, por David Tennant), não geraram qualquer “moda”. Daí também o efeito de redescoberta que o novo filme de Michael Sturminger envolve — afinal de contas, Casanova sobreviveu ao seu próprio mito.