sexta-feira, outubro 17, 2014

Revisitando Drácula (2/2)

HORROR DE DRÁCULA (1958)
A estreia de Drácula: a História Desconhecida surge, aqui, como pretexto para revisitar algumas referências emblemáticas na história cinematográfica dos vampiros — este texto foi publicado no Diário de Notícias (5 Outubro), com o título 'Elogio dos vampiros'.

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As coisas mudam... Quando consultamos a biografia oficial de Christopher Lee, as primeiras linhas definem-no como “estrela da trilogia de O Senhor dos Anéis”, de Peter Jackson, depois citando a sua participação em dois episódios de A Guerra das Estrelas, produzidos por George Lucas. Onde está, então, a memória das suas lendárias interpretações do Conde Drácula? Há apenas uma referência ao filme Dracula (1958), entre nós chamado O Horror de Drácula [traduzindo a versão americana], sem que seja citado o nome fundamental do seu realizador, Terence Fisher, nem sequer o respectivo ano de produção. Mais ainda: na caracterização dos grandes papéis de Lee, a sua emblemática passagem pelas produções da Hammer Films é omitida e até mesmo a palavra “vampiro” nunca é utilizada...
Há outra maneira de caracterizar esta opção. Envolve um factor lamentável: a redução da memória a matrizes do presente, rasurando as diferenças e contrastes do próprio devir histórico. No caso concreto de Christopher Lee, defini-lo a partir dos seus papéis nos filmes de Peter Jackson ou George Lucas é uma simplificação tão infeliz como seria, por exemplo, considerar que a importância histórica de Alfred Hitchcock provém do facto de ter revelado Shirley MacLaine (o que, aliás, não deixa de ser verdade: foi sob a sua direcção que ela se estreou, em 1955, no filme O Terceiro Tiro).
Há, aqui, um sintoma que, como é óbvio, excede o caso pontual de Christopher Lee. Dir-se-ia que os padrões correntes da aventura e do espectáculo se dão mal com a pluralidade de um século de história do cinema. Há mesmo toda uma nova “cinefilia” que menospreza o valor das memórias, desse modo renegando o próprio gosto cinéfilo. Enfim, estejamos atentos ao simplismo do presente e não abdiquemos da convivência com os vampiros.