O SILÊNCIO (1963) |
Grande acontecimento em DVD, depois da exibição em Lisboa e Porto (e mais algumas cidades): a edição de 17 filmes de Ingmar Bergman (1918-2007), a maior parte em cópias restauradas — razões de sobra para rever algumas imagens emblemáticas da filmografia do mestre sueco.
[ 1 ] [ 2 ] [ 3 ] [ 4 ] [ 5 ] [ 6 ] [ 7 ] [ 8 ] [ 9 ]
Encerrando a trilogia "Deus e o Homem" — depois de Em Busca da Verdade (1961) e Luz de Inverno (1963) —, apetece dizer que O Silêncio é também o filme em que a divindade, definitivamente, já não se exprime, ao mesmo tempo que os homens definem um território volátil, dramaticamente carente de sentido. Aliás, tal volatilidade deverá ser tomada à letra, numa espécie de apagamento dos géneros (mas não da pulsão sexual), já que tudo se passa a partir da experiência de duas irmãs (Ingrid Thulin e Gunnel Lindblom) a viajar num país tanto mais inquietante quanto, além dos sinais de guerra civil que parecem emergir nas suas ruas, a respectiva língua é, para elas, completamente indecifrável. A criança que as acompanha (Jörgen Lindström, na altura com 11/12 anos; surgirá em 1966 na abertura de A Máscara) existe como uma ambígua emanação carnal do desentendimento dos sexos, de tal modo que se pode dizer que Bergman lhe atribui uma função exclusivamente cinematográfica — ao deambular pelos corredores de um hotel labiríntico, povoado de figuras mais ou menos circenses, o sereno Johan comporta-se como uma câmara no interior do próprio filme, contemplando a desagregação simbólica do mundo dos adultos. Se Bergman é o cineasta da incomunicabilidade, O Silêncio é a ilustração mais radical do seu desencanto existencial.