terça-feira, maio 13, 2014

Em conversa: Max Richter


Esta entrevista serviu de base ao artigo 'A arte de reinventar uma peça da história da música' publicada na edição de 9 de maio do DN, assinalando a edição nacional de 'Vivaldi's Four Seasons – Re-Composed'.

Até à edição deste seu disco, os títulos da série Re-composed mostravam um trabalho mais orientado no sentido mais habitual das técnicas de DJs. Usavam mais ideias frequentes na música eletrónica e em formas de trabalho em estúdio que um foco na partitura, que é o que aqui resolvei fazer...
Em Vivaldi o que me interessava mais era o texto. É claro que é possível manipular o áudio de muitas maneiras, com um computador ou em estúdio, mas o que me interessava mesmo era o texto. E para poder trabalhar com isso precisei de reescrever antes de poder gravar. De certa forma esta foi assim uma remistura em papel, uma remistura analógica. Como compositor trabalho muito com música eletrónica, mas a minha preparação original e o meu universo de partida era o da música feita com pontos num papel. Por isso esta perspetiva.

Que relação tinha antes com as Quatro Estações de Vivaldi?
A principal força motriz de todo este trabalho foi mesmo a minha relação com a obra original. Apaixonei-me por esta obra em criança, foi mesmo das primeiras peças de música clássica que me conheci. Esta e o Eine Kleine Nachtmusik... São coisas que andam por aí e que acabamos por conhecer. Mas apaixonei-me pelo Vivaldi e ouvi-o muito. Ao longo dos anos, contudo, e de tanto ouvir, cansei-me. Para mim o projeto era mesmo artístico. Era o de tentar reclamar essa sensação de maravilha perante o original.

Consegue identificar já o que é a música do século XXI?
Creio que a tendência dominante é a ideia das tradições musicais se interpenetrarem e das fronteiras ficaram difusas.

O cinema tem sido um importante espaço de trabalho para si. Mas este ano a sua obra extra-cinema em disco está a ser reeditada. Memoryhouse, por exemplo, está já disponível em vinil.
Tocamos peças desse disco de tempo a temo e fizemo-lo todo no Barbican em janeiro. Ouvi-o ao remasterizar e foi como rever um velho amigo. Foi uma experiência interessante essa ligação com a memória. É fascinante reencontrá-lo uns anos depois.

Viu o trailer do filme A Essência do Amor, de Terrence Malick, que usaba o tema November desse mesmo álbum?
Não vi o filme embora adore o trabalho do Terrence Malick. Mas vi o trailer.

Qual a importância da música para cinema no espaço atual do seu trabalho?
De certa maneira o cinema é uma das maneiras para alguns músicos poderem viver hoje em dia. E para mim é algo muito natural isso de trabalhar no cinema, como o é em ópera ou bailado ou fazer discos. São partes muito naturais do meu espetro de atividades. Na verdade o que para mim é estranho é quando as pessoas fazem uma distinção entre ser compositor e compositor para cinema. No século XVIII não havia isso com os compositores de ópera.

Gostaria de desenvolver uma relação prolongada e recorrente com um mesmo realizador?
Quando se trabalha com um realizador mais que uma vez não temos de voltar a inventar a roda. Temos assim a nossa linguagem já no seu sítio. Eu trabalhei com o Ari Folman em Valsa com Bashir e agora no seu novo filme. E foi fácil porque já sabíamos o modo de pensar um do outro.