segunda-feira, abril 07, 2014

"Sei Lá", um filme de 2014 (3/3)

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Há uma prova de real que, importa reconhecer, o cinema português nem sempre tem sabido, ou conseguido, assumir — mesmo quando obstinadamente a procura. Dito de outro modo: para além de considerarmos determinados filmes "melhores" ou "piores" (não são meros juízos de valor que estão em causa), o cinema português tem tido dificuldade em manter uma relação com os espectadores alicerçada em efeitos de reconhecimento social, simbólico ou apenas temático. Quantas vezes um filme português consegue desencadear uma reacção de cumplicidade — "a nossa vida é assim" — enraizada numa genuína lógica de identificação?
O problema agrava-se com Sei Lá, já que a extensão do seu imaginário temático parece esgotar-se numa dicotomia ultra-simplista "homens/mulheres" cuja único enunciado detectável parece ser a ideia (?) segundo a qual as mulheres não precisam dos homens "para nada"... Estamos, enfim, no interior de um território obviamente telenovelesco, eventualmente esperando que o entendamos apenas como paródia fútil, mas incapaz de sustentar algo mais do que um mini-filme promocional — o trailer de Sei Lá é revelador: todas as "mensagens" do filme estão esgotadas em dois breves minutos...


Não se trata, entenda-se, de esperar ou exigir mais realismo — um filme pode apostar em registos assumidamente artificiosos e, ainda assim, aproximar-se das convulsões específicas do seu/nosso presente. Trata-se, isso sim, de perguntar que conceito de cinema se consolida através desta colagem ao universo das telenovelas, para mais submetida a métodos de fragmentação e "aceleração" narrativa típicos das práticas mais rotineiras dos spots publicitários?