quinta-feira, junho 13, 2013

A Grécia sem televisão

1. Subitamente, compreendemos que a existência da televisão não é um apêndice da vida social, mas uma das suas configurações mais importantes — sem televisão, mudam todas as significações do mundo. Provavelmente, muitos de nós mantêm vivo o pensamento utópico de outras formas de pensar & fazer televisão, primeiro que tudo recusando a degradação moral e comunicacional, numa palavra, humana que os horrores da reality TV impuseram à nossa existência pública e privada.

2. Desta vez, porém, o que está em causa é bem diferente: a decisão tomada pelo governo de Antonis Samaras de fechar os canais da televisão (e rádio) pública grega constitui um golpe brutal no próprio conceito de sociedade democrática. Em nome da "austeridade" (palavra que se tornou um operador político tendencialmente desprovido de sentido, já que serve para legitimar muita coisa cujo sentido não é sequer enunciado), os cidadãos gregos viram-se e vêem-se confrontados com uma situação em que o concreto mais incontornável se confunde com o absurdo mais irracional [video do New York Times]. Em manchete, o Libération pergunta mesmo "Quem extinguiu a televisão?", registando o facto de Atenas e Bruxelas devolverem entre si as responsabilidades da decisão, enquanto o Le Monde cita os que referem que nunca se viu nada assim, "mesmo durante a ditadura" (1967-74).

3. No limite, a situação confronta-nos com uma questão que, infelizmente para todos nós, as classes políticas dos países europeus tendem a ignorar ou tratar de forma ligeira: hoje em dia, para o melhor e para o pior, toda a dinâmica dos valores sociais passa pelo espaço televisivo. Somos todos gregos.