Karl Bartos
“Off The Record”
Bureau B
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Os Kraftwerk chamaram-no para a Autobahn Tour (em 1975) como percussionista, mas acabou por ficar, integrando o grupo e chegando mesmo a colaborar na composição e até mesmo na vocalização, afastando-se em 1990, a meio caminho entre Electric Cafe (disco de 1986 entretanto rebatizado sob a sua designação original, Techno Pop) e The Mix (1991). De então para cá Karl Bartos criou o seu próprio projeto (Elektric Muzik, através do qual editou dois álbuns) e assinou colaborações com nomes como os Electronic ou Orchestral Manouevers In The Dark, trabalhou em música para cinema, encetando em 2003 uma discografia a solo em nome próprio. Dez anos depois de Communication, Off The Record é o seu sucessor na discografia a solo de Karl Bartos, mas não necessariamente um episódio “seguinte”. Na verdade o que escutamos aqui são os ecos (já distantes) de fragmentos de um diário áudio que o músico manteve ativo nos tempos em que integrava os Kraftwerk. E que, perante o desafio de os mostrar, terá arrumado e, de alguma forma moldado, daí nascendo o alinhamento que agora escutamos. Sem ficar claro o que são gravações de época ou o que foi eventualmente retrabalhado (e essa aura de mistério é, convenhamos, outra “herança” dos tempos passados nos Kraftwerk), Off The Record é assim uma coleção de reflexões sobre memórias. Em Atomium encontramos uma descendência natural de Radioactivity. Entre Nachtfahrt ou International Velvet há sinais de uma descoberta do labor sobre o formato da canção em terreno electrónico como recordamos no mítico The Man Machine (1978). Binary Code evoca ensaios característicos de quem explorava as potencialidades das máquinas sob sonhos sci-fi em meados dos setentas. Rhytmus herda o sentido metronómico de uma pop ensaiada entre Trans Europe Express e Computer World (e até mesmo Tour de France). Já Hausmusik traduz um sentido de luminosidade bem humorada que era algo alienígena à música do quarteto de Dusseldorf. De resto, um certo tom lúdico, que cruza o alinhamento, distingue muitas destas composições do quadro de regras mais estritas no qual sempre se desenhou a música dos Kraftwerk. Pelo que, mesmo contemporâneas de alguns discos que ajudaram a escrever a história da música popular, as ideias que encontramos neste disco são, tanto como as que escutámos em discos pioneiros de nomes como os Human League, DAF, Cabaret Voltaire ou OMD entre finais dos setentas e inícios dos oitentas, primeiras manifestações de descendência direta dos Kraftwerk. Estas por acaso nascidas “em casa”. Mas fechadas numa gaveta anos a fio. Até que alguém teve a boa ideia de convidar o dono da chave a deixá-las de lá sair. Off The Record é assim, mesmo lançado em 2013, um disco que nos faz pensar nessa etapa em que a canção procurava nova voz (e sentido), explorando as novas electrónicas. Podemos assim sentir, como aconteceu por exemplo com o álbum do projeto The Devils (aventura de Nick Rhodes e Stephen Duffy que, em 2003, regravou os temas, ainda inédoitos, da formação inicial dos Duran Duran em 1978), que há aqui uma carga de “arquivo”. Mas a luz pop que exala destes temas, o fulgor de verdade pioneira que as atravessa e o relativo silêncio que desde 2003 nos chega de campos kraftwerkianos (salvo as atuações, gravações ao vivo e reedições) fazem deste um mimo saboroso para quaisquer admiradores dos fab four da música electrónica.