Disponível em vários espaços de evocação na Internet, esta imagem do átrio do cinema Eden (com dois cartazes de Christopher Lee no cimo da escadaria...) é bem reveladora daquilo que se perdeu — porque, para nossa tristeza e vergonha, tudo isto lá perdura, fechado e desactivado. Está por fazer, aliás, o inventário dos crimes de indiferença acumulados, país fora, contra o património das nossas mais belas salas de cinema e teatro...
Em todo o caso, o Eden viveu ainda um período de efémero "revivalismo" graças à música. Mais precisamente: foi lá que se instalou a Virgin Megastore com um impacto inicial que, afinal, foi o prenúncio de uma existência relativamente breve.
Não quero favorecer qualquer saudosismo beato, como não pretendo escamotear a lógica de acumulação, de "grande consumo", que presidia ao Megastore. Não era uma loja de tendência(s) ou para especialista(s). Mas era também isso que lhe conferia uma sedução muito especial. Porquê? Porque a sua vocação de montra imediata dos lançamentos de maior pompa promocional (afinal de contas, foram as Spice Girls que cantaram na inauguração!) não impedia, bem pelo contrário, que a oferta fosse, nos domínios mais diversos, muito rica e contrastada. Por exemplo, nas electrónicas — foi lá que descobri algumas raridades de William Orbit, noblesse oblige. Ou no jazz. E ainda nas bandas sonoras. A própria secção de DVD não era nada desprezível e, nos saldos dos dias finais, literalmente perdida na confusão de uma grande caixa de "restos", lá encontrei nada mais nada menos que a magnífica edição do Alphaville (1965), de Godard, com chancela da Criterion.
Tudo isto, claro, sem esquecer que, naquele local, a presença da Virgin correspondia ainda a um entendimento vital dos Restauradores como um espaço de vivências específicas, espécie de espelho ambíguo em que a cidade podia contemplar a sua própria vertigem, ao mesmo tempo recolhendo-se no cenário luminoso de alguma aquietação. Foi assim, aliás, que Fernando Lopes filmou a fachada do Eden, no seu Belarmino (1964) — agora, dói ver como o cinema português possui uma memória que a cidade, perdida nas razões mais estúpidas do progresso, não soube guardar.